quarta-feira, 12 de maio de 2010

Pequenas alegrias urbanas (106) -- No sofá

Sentiu uma ternura súbita, uma vontade insuportável de se dar, de se doar, de se entregar inteira, de encostar o peito em um peito ansioso como o dela e ser apertada por um abraço que, só de ser imaginado, a fez suspirar. O gato - que dormia em seu colo e desfrutava, como ela, a mornidão do sol, que havia entrado pelo janelão do apartamento e se aninhara entre os dois, no sofá -- estremeceu também, como se no sonho tivesse sido tocado pelo mesmo anseio. A mulher passou a mão no seu pelo sedoso, para acalmá-lo, mas ele se pôs em pé no colo dela e a olhou com um olhar tão terno que ela esqueceu como havia lastimado, um momento antes, quem, lá fora, talvez precisasse desesperadamente daquela ternura funda, aguda, ávida, que ela agora punha no sopro com o qual arrepiava os bigodes do gato.

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