quinta-feira, 3 de junho de 2010

Pequenas alegrias urbanas (174) -- Imorredouro

"Minha querida, não vou lhe dizer nada. Dizer o quê? Que a amo? Está bom, eu digo. Não tenho dito outra coisa - com essas três minúsculas palavras ou com outras, maiores. Disse isso com parágrafos e mais parágrafos, com textos que jorravam como rios, que se precipitavam como cachoeiras, que retumbavam, que faziam espuma, que se exibiam como saltimbancos e pediam aplausos. Hoje peguei por acaso um desses textos e me perguntei como pude usar certos adjetivos, que nem o amor é capaz de redimir e absolver. Imorredouro? Perene? Santo Deus! Quem permitiu que essas palavras constassem nos dicionários? Imorredouro... Imorredouro! Vi esse monstrengo e ri, ri muito, posso dizer que senti mesmo uma dessas pequenas alegrias que são quase uma felicidade. E sabe por quê? Porque me lembrei de que, no dia em que escrevi essa estúpida palavra, fiquei em dúvida e quase a substituí por sempiterno. Sempiterno! Isso é que eu fui aprender na escola? Melhor, então, dizer apenas que a amo. Tão simples, tão claro, tão riacho, tão arroio, tão regato fluindo mansamente, tranquilamente, humildemente, único e sereno como a verdade."

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