domingo, 25 de julho de 2010

Situações (4) - Amor e amizade

Ela gostava dele, mas vagamente. Um dia um pouquinho mais, no dia seguinte um tanto menos, mas gostava. Uma ou duas vezes lhe ocorreu pensar em amor, mas nessas ocasiões um sorriso quase de desdém imediatamente lhe vinha, quando ela se lembrava de certas insignificâncias dele, que nem ele conseguiria vencer nem ela poderia vir a tolerar. Continuou então assim, mantendo com ele um convívio para o qual talvez o adjetivo mais adequado fosse "medíocre". Já ele, quando pensava nela, quando a via, quando lhe falava, pensava, via e falava movido por algo que não poderia ser considerado menos do que amor. Na verdade, amor era pouco. No cérebro dele, os adjetivos que se juntavam à palavra amor eram: grande, maravilhoso, sublime, único. O tempo levou a situação para os extremos: ela passou a bocejar quando o via e já quase nem falava mais com ele. Ele também evitava falar com ela, porque as palavras lhe saíam ininteligíveis, molhadas pelas lágrimas e truncadas pelos soluços que exprimiam um amor tresloucado. Atingiram assim um meio-termo que alguns dizem ser o ideal, na vida: a indiferença dela e a exaltação dele, somadas e depois divididas por dois, resultaram numa nota cinco, pelo critério matemático, e num conceito que, se fosse definido em palavras, seria este: "regular". Como se diz, vão levando.

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