domingo, 6 de março de 2011

Às vezes

Às vezes acha
que deveria ser como os outros
enfiar-se naqueles bailes
em que colam grau
risonhas costureirinhas
trajadas como rainhas
saudáveis cabeleireiras
com aqueles cabelos
que jorram como cachoeiras
e rodopiar
e dançar dançar
todas aquelas músicas tolas
até que alguém
viesse lhe tocar o ombro
ô meu amigo ô
e mostrar que a luz
está apagada e há muito
o baile acabou

Às vezes acha
que deveria fazer isso
mas fica sempre
do lado de fora
debaixo de uma chuva exclusiva
espreitando como um assassino
e ouvindo sempre
em vez do pistom
e das maracas
as lamentações fracas
daquele tuberculoso violino
que no seu peito
só para ele toca

Às vezes acha
que deveria ser como os outros
ir para o fundo de um bar
e beber ali
e ali ficar
até que sua alma
chegando à garganta
não lhe restasse
nada além de expeli-la
e expelindo-a
afinal se livrasse
do que o faz diferente
do que importuno o faz
para toda a gente

Às vezes acha
que deveria fazer isso
mas passa apenas pelo bar
não entra nunca
e se um dia entrar
pedirá uma bebida fina
como se fosse uma menina

Não tomará o cálice inteiro
e se retirará
como um cavalheiro
sem ter tido a coragem
de largar sua alma amarga
no calamitoso banheiro
e sem misericórdia puxar
a estrepitosa descarga

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