segunda-feira, 1 de outubro de 2012

A poesia, nua como deve ser

Descobri, com muito atraso e vergonha, que desde os doze anos venho procurando não a poesia, mas a melhor forma de vesti-la, de empetecá-la, de emperiquitá-la como se ela fosse uma boneca russa. Aprendi a adorná-la, a enfeitá-la. Tratei-a como se fosse uma menina preparada para ser a mulher de um príncipe. Matriculei-a em aulas de piano, de balé, de boas maneiras. Que orgulho me deu vê-la sofisticada, reconhecida e, melhor que isso, sabendo retribuir tudo com a majestade de uma rainha. E com que prazer eu ia lhe acrescentando vestes e enfeites. Tudo com que a ornei, e com que eu imaginava poder destacar-lhe a beleza, a sufocou durante todo esse tempo. Tudo não passava de miçangas, berloques, ouropéis. Como pude ser assim estúpido? As vitórias dela me encantavam e, como vampiro, eu ia bebendo seu sangue. Só recentemente notei a palidez do seu rosto, por baixo do ruge e do batom que eu a obrigava a usar. E, observando como fracas pareciam suas pernas e seus pés, livrei-a das meias e das sapatilhas. Suspeitei que deveria despojá-la de tudo. E finalmente a vi, simples, frágil, autêntica como ela era antes, quando eu ainda não tinha começado a afogá-la com os penduricalho de minha falsa arte.

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