sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Algumas estrofes de Alberto de Oliveira

"O SONHO DE BERTA

Soltando o cabelo de ouro
Ao deitar-se, ondeante e farto,
Viu Berta entrar-lhe no quarto
Um besouro.

"Já agora" - exclamara ela -
"Não me levanto, é capricho,
Para mostrar a este bicho
A janela;

Nem da toalha um açoite
farei contra este besouro...
E sem mais, senhor agouro,
Boa noite!"

Despiu-se. Cândida e lisa,
Quente ainda de sua pele
Tirou, mesmo diante dele,
A camisa.

Deitou-se. É um mimo de Berta
O corpo, que a vista inflama,
Assim como está na cama
Descoberta.

Cerra os olhos. Entretanto
O besouro, tonto, inquieto,
Zumbe da alcova no teto,
Zumbe a um canto,

Ao pé do espelho inclinado
Zumbe, zumbe na parede,
E de Berta agora - vede! -
Zumbe ao lado.

Ai dela! rente ao cabelo
Sente-lhe as asas... que inferno!
Quem a livra desse eterno
Pesadelo?

Ai dela! - Noite sombria,
As tardas horas apressa!
A luz da aurora apareça!
Venha o dia!

Sobre o leito, em que deitada
Está, volta-se ofegante
Berta insone, a cada instante,
De assustada.

Pobre Berta! enfim sucumbe,
Desmaia... Entretanto, às voltas,
O besouro de asas soltas
Zumbe, zumbe..."

(Do livro Poesia de Alberto de Oliveira, coleção Nossos Clássicos, da Livraria Agir Editora.)

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