terça-feira, 30 de abril de 2013

Se esse dia houver

Reconhecerá o Amor se um dia tiver ainda a ventura de passar por ele? Houve tempo em que o sentia na pele, como um marujo velho sente a borrasca espreitando o navio numa manhã de sol imaculadamente azul. Sua pele hoje só tem sensibilidade para o frio e seus olhos distinguem apenas a treva. Talvez os ouvidos, se lhes chegasse a voz única, que ele reconheceria entre os bilhões de outras vozes do mundo, lhe dissessem, alvoroçados: é ela. Mas os ouvidos, hoje, não ouviriam um tiro de canhão, ainda que o disparassem a cem jardas deles. Receia que os ouvidos não ouçam sequer o chamado da Morte, que ele aguarda dia e noite, enquanto sopra suas chagas. Espera que a Morte tenha braços compridos e não tarde. Nos momentos em que a vida lhe dói mais que de costume, ele é tomado por um pavor: e se a Morte tiver morrido?

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