segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Segunda-feira

É mais um dia que nos olha e nos diz: viva-me. Ele bem vê, ele bem sabe que todas as ambições nos deixaram, que os sonhos há muito se foram, que já descremos de todas as crenças e já não cremos no amor como nossa última salvação. No entanto, ele nos incita a vivê-lo, como se fosse uma mulher que durante cinquenta anos se tivesse dado ao marido e agora, mostrando-lhe a devastação do corpo, o faz lembrar-se de um antigo juramento. Havemos de viver mais este dia, ignorar-lhe as machucaduras e os sinais de sua irreversível decadência. Havemos de tornar nossos olhos ainda mais cegos e buscar uma resignação como aquela dos santos. Viveremos mais este dia, porque nossos passos já não são capazes de ir sequer até a esquina e porque as fugas exigem uma força de que não dispomos mais. Nós te viveremos, velha segunda-feira, tão estropiada quanto nós. E, porque és surda também, te maldizemos por nos ter acordado e nos ter feito ir até a janela.

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