domingo, 25 de abril de 2010
Pequenas alegrias urbanas (57) -- Luxúria
Passando lentamente e repassando ainda mais lentamente a língua no lábio superior, como se procurasse um sabor reminiscente de chantili, ela no espaço entre quatro estações do metrô perturbou de maneira tão louca o homem sentado à sua frente que, ao descer, notou logo que ele a acompanhava e seus passos, de três em três, deixavam no ar uma palavra: luxúria, luxúria, luxúria. Ouvindo cada vez mais perto essa palavra, ela chegou à escada rolante e, ao pôr o pé no primeiro degrau, sentiu o hálito do homem na sua nuca. Fruindo já o que aconteceria, ela suspirou, para manter o homem enfeitiçado. Assim que ela chegou ao topo da escada, o homem, como ela havia querido e previsto, a pegou pelo ombro e ia dizer alguma coisa (ou não dizer nada, tal era o estado de sua exaltação amorosa), quando um soco o atingiu no nariz e o atirou ao chão. Ela deu o braço ao agressor, que todas as tardes a esperava ali e que disseram ser seu marido ou algo semelhante, e olhou com desprezo para o homem no chão, o mesmo que uma semana antes havia fingido não reparar nos lentos movimentos de sua língua porque estava com uma garota loira, espalhafatosa e muito atraente.
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