domingo, 18 de julho de 2010
Lírica (169) - Perjúrio
Acreditou que ninguém pudesse jamais ter sofrido tanto quanto ele por amor e, porque essa crença se transformou na obsessão de sua vida, ele a cultivou como a mais rara das flores. Viveu por ela e para ela, e em nada mais pensou e nada mais fez que não fosse movido por ela. Mirrou, definhou e, enquanto mirrava e definhava, a flor crescia soberba em sua alma e dia a dia lhe reforçava a convicção de ser a única no mundo. Mas sempre há, no caminho dos que acreditam, os risos de escárnio e as chicotadas da zombaria. Começaram a chamá-lo de mimalho, de tolo, de piegas, e persistiram tanto em escarnecê-lo que ele fraquejou em sua crença e, por fim, a renegou. Enquanto a flor de seu sofrimento murchava, o rosto dele foi ganhando as saudáveis cores do rosto de um açougueiro e seu corpo fanado se transformou rapidamente em corpanzil. Abjurado o amor e seu supremo atributo - a dor -, não mais compunha delicados versos, mas odes à libertinagem e à dissolução. E foi pungente isso, e deplorável, porque, se bem que agora não acreditasse mais, ele estivera todo o tempo certo, e o seu havia sido, mesmo, o maior sofrimento a que um homem se submetera por amor.
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