sábado, 10 de julho de 2010
Lírica (216) - Pai
Uma noite, pegou o amor, olhou-o por algum tempo - não muito, para não chorar - e, abrindo melancolicamente a gaveta da estante, colocou-o com cuidado lá dentro, junto com seus velhos originais. Fechou a gaveta lastimando que aquele não fosse seu último gesto na vida e, ao apagar a luz da sala e começar a subir para o quarto, onde o esperava a insônia, ouviu os gritos dos originais, aos quais estava acostumado, agora seguidos pelas lamúrias do amor. Sufocados no escuro, clamavam por quem os criara e lhes prometera tanto. Seus originais, seu amor - seus tristes filhos rejeitados pelo mundo e agora também, definitivamente, pelo próprio pai, que, chegando ao quarto, encostou a porta, para que sua insônia não fosse atormentada pelos pedidos de socorro e pelas maldições dos inocentes.
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