sábado, 24 de julho de 2010
Situações (1) - Para o seu bem
Ela sugeriu que, para o bem dele, se afastassem um pouco, dessem um tempo. Achava que ele estava apaixonado demais, era uma doença já. "Um tempo? Quanto? Uma semana?", ele perguntou, e ela disse: "Vamos ver." Sairia para uma viagem e, quando voltasse, se ele tivesse conseguido domar sua paixão, reduzindo-a pelo menos à metade, retomariam o caminho do amor (como ela, subliterariamente, disse). Ele ficou quatro anos sem saber onde e como ela estava, sem poder lhe enviar ou receber mensagens. Para o bem dele, como ela dissera. Quando ela voltou, ele estava vivendo fazia quase um ano com uma garota meio bobinha (talvez até mais do que ele), que se arrastava pachorrentamente pela casa, carregando no ventre um filho de três meses. No momento em que reviu a amada, ele se esqueceu da garota e do filho e a abraçou com desespero e esperança. "Parece que você não mudou nada", ela disse, contrariada, e ele se desculpou, atribuindo seu ímpeto ao longo tempo de separação. Falou-lhe da sua nova situação, e ela achou muito conveniente o que acontecera na sua ausência. Via-o agora preparado para encarar com equilíbrio uma relação amorosa (talvez até duas). Não foi assim. Ele se abrasou de novo e a chamou de mesquinha, por nunca se encontrar com ele senão às sextas-feiras à noite, para uma horinha de motel. Numa dessas sextas-feiras ele ficou esperando por ela até a madrugada de sábado. Nunca mais a viu nem ouviu falar dela. Isso foi em 2010. É outro homem hoje, dedicado à mulher e ao filho. A doce, perversa, pérfida e malévola amada, se o visse agora, diria: "Viu? Foi tudo para o seu bem, tolinho. Sempre."
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