domingo, 7 de novembro de 2010
Situações (113) - Nosso primeiro morto
Mesmo hoje, o bairro onde vivi minha infância e adolescência não é muito conhecido. Na época em que andei pelas suas ruas com a minha bicicleta, ele tinha acabado de nascer. Tudo ali era novo, sem tradição. O que diziam de nós os orgulhosos moradores do Brás, da Penha, da Mooca, da Vila Maria? Nada. Habitávamos um lugar desconhecido, era inegável, e nos ressentíamos com isso. Poucas coisas aconteciam ali, e o que acontecia era indigno de menção. Não havia ainda, que me lembre, jornais de bairro, e o Estadão, a Folha, a Gazeta e o Correio Paulistano eram inatingíveis para nós, com nosso paupérrimo cotidiano. Foi assim, até que uma tarde um táxi atropelou e matou um homem em nossa principal avenida. Bom, ali estava afinal a chance de notoriedade que tanto esperávamos. O motorista, a vítima e o próprio táxi seriam os primeiros heróis da nossa história. No dia seguinte, cheios de antecipado orgulho, fomos comprar os jornais. Nada, em nenhum deles. Nosso primeiro caso de atropelamento e morte, num tempo em que não eram comuns atropelamentos e mortes em São Paulo, passou em branco. Talvez algum dos quatro jornais tenha até mandado um repórter ao nosso bairro. Mas quem saberia como chegar ao Jardim da Saúde?
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