Houve um tempo
em que como vocês
eu vagabundeava por aí
um tempo em que
andava reto de dia
ou assim fingia
e à noite de gim embriagado
sem rumo e sem nexo
com o nariz
como um falo empinado
farejava a maresia do sexo
Não fui infeliz
se querem saber
Conheci os mais asquerosos hotéis
os mais safados bordéis
e as putas mais dissolutas
nas coxas das quais
como agonizantes animais
estrebuchavam saciados
magistrados deputados
rábulas e bacharéis
Vi o sol nascer
nas ruas de mijo regadas
nas auroras nas andradas
nas líberos nas quintinos
nas vitórias nas quirinos
na esquiva direita
e no largo das arcadas
de onde um dia
minha mãe esperava
porque nas cartas leu
que um grande homem sairia
o maior de todos
o menino que dela nasceu
Não terminei o curso
não me formei
fui possuído pela noite
e à noite
inteiro me entreguei
Embora digam que sim
não foi a noite
a minha perdição
Ela foi sempre
muito justa comigo
copos joguei
copos me atiraram
putos me espancaram
putos eu espanquei
putas me lesaram
putas eu lesei
Assim vivi
e me agradaria
se este texto dissesse
que assim morri
Sobrevivi porém
para dizer a vocês
que sou agora isto
este paletó
esta gravata
este homem
normal entre os normais
que enfim
pelo bem de todos
e de alguns mais
me obrigaram a ser
e que quando morrer
terá suas virtudes
de bom cidadão
celebradas nos jornais
Mas tenho saudade sim
daquele tempo
de loucura e dissipação
em que sem rumo e sem nexo
implorei por álcool e por sexo
na rego freitas
na bento freitas
na joão mendes
e na consolação
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