"O SONHO DE BERTA
Soltando o cabelo de ouro
Ao deitar-se, ondeante e farto,
Viu Berta entrar-lhe no quarto
Um besouro.
"Já agora" - exclamara ela -
"Não me levanto, é capricho,
Para mostrar a este bicho
A janela;
Nem da toalha um açoite
farei contra este besouro...
E sem mais, senhor agouro,
Boa noite!"
Despiu-se. Cândida e lisa,
Quente ainda de sua pele
Tirou, mesmo diante dele,
A camisa.
Deitou-se. É um mimo de Berta
O corpo, que a vista inflama,
Assim como está na cama
Descoberta.
Cerra os olhos. Entretanto
O besouro, tonto, inquieto,
Zumbe da alcova no teto,
Zumbe a um canto,
Ao pé do espelho inclinado
Zumbe, zumbe na parede,
E de Berta agora - vede! -
Zumbe ao lado.
Ai dela! rente ao cabelo
Sente-lhe as asas... que inferno!
Quem a livra desse eterno
Pesadelo?
Ai dela! - Noite sombria,
As tardas horas apressa!
A luz da aurora apareça!
Venha o dia!
Sobre o leito, em que deitada
Está, volta-se ofegante
Berta insone, a cada instante,
De assustada.
Pobre Berta! enfim sucumbe,
Desmaia... Entretanto, às voltas,
O besouro de asas soltas
Zumbe, zumbe..."
(Do livro Poesia de Alberto de Oliveira, coleção Nossos Clássicos, da Livraria Agir Editora.)
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