"Se eu algum dia me suicidar, será num domingo. É o dia mais desalentado, o mais sem graça. Quem me dera ficar na cama até tarde, pelo menos até as nove ou as dez, mas às seis e meia acordo sozinho e já não consigo pregar o olho. Às vezes penso o que farei quando toda a minha vida for domingo. Quem sabe? Vai ver que me acostumo a despertar às dez horas. Fui almoçar no Centro, porque os rapazes saíram para o fim de semana fora, cada um para seu lado. Comi sozinho. Nem sequer tive forças para entabular com o garçom o fácil e ritualístico intercâmbio de opiniões sobre o calor e os turistas. Duas mesas adiante, havia outro solitário. Tinha o cenho franzido, partia os pãezinhos a socos. Duas ou três vezes olhei para ele, e numa oportunidade seus olhos se cruzaram com os meus. Tive a impressão de que ali havia ódio. O que haveria para ele nos meus olhos? Deve ser uma regra geral, isso de nós, os solitários, não simpatizarmos uns com os outros. Ou será que, simplesmente, somos antipáticos?"
(Do livro A trégua, traduzido por Joana Angélica D'Avila Melo e publicado pela Alfaguara.)
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