"Você passa a prestar muita atenção na mulher que veio morar na casa amarela da vila. Morenos, ela e o marido, ele um pouco mais escuro. Você sabe que ele trabalha à noite, no pesado. Já escutou, no bar, neguinho dizendo que homem que tem trabalho noturno não dá conta em casa. Então você olha com mais capricho toda vez que a mulher passa em frente à oficina: a caminho da padaria ou do mercadinho de verduras ou, de banho tomado, à tarde, na direção do ponto de ônibus para o centro. Até que um dia ela olha de volta, curiosa. Você cumprimenta, fingindo respeito. Bem nesse dia ela veste uma calça vermelha, justa. Infernal. Na próxima vez, você já sabe: deve sorrir na hora do cumprimento. O marido trabalha à noite, não dá conta do recado. Pelo menos é o que você pensa. Até descobrir que não é bem assim. Mas aí será um pouco tarde. Como é que você ia adivinhar que o cara é da PM, se não fosse a mulher contar, rindo, na cama?"
[Do conto "Dez maneiras infalíveis de arranjar um inimigo (para facilitar o trabalho do legista)", do livro Faroestes, publicado pela Ciência do Acidente.]
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