terça-feira, 12 de novembro de 2013

"Interrogar os mortos", de Margaret Atwood

"Vá à entrada de uma caverna,
cave uma vala, corte a garganta
de um animal, derrame o sangue.

Ou sente-se numa cadeira
com outras pessoas, ante uma mesa redonda
num quarto na penumbra.
Fechem os olhos, deem-se as mãos.

Essas técnicas poderiam ser chamadas
a heroica e a mezzotint.
Não temos certeza se acreditamos em alguma,

ou nos mortos, quando eles aparecem
com cheiro de cabelo úmido,
bruxuleando como torradeiras defeituosas,
seus rostos de lenços de papel
farfalhando, seus sons sibilantes, suas fissuras,
arrastando sua gaze fraudulenta.

Suas vozes são secas como lentilhas
caindo num jarro de vidro.
Por que não podem falar com clareza
em vez de murmurar sobre chaves e números,
e escadas, eles mencionam escadas...

Por que continuamos a importuná-los?
Por que insistimos que nos amem?
O que gostaríamos de lhes perguntar,
afinal? Nada que eles queiram dizer.

Ou pare diante de um poço ou um lago
e deixe cair ali uma pedra.
O som que ouvirá é a pergunta
que deveria ter feito.

A resposta também."

(Do livro A porta, tradução de Adriana Lisboa, publicado pela Rocco.)

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