segunda-feira, 7 de julho de 2014
Que eu
Que eu esta noite seja abençoado com sonhos de luxúria, coxas generosas, seios úberes, folhagens exuberantes e suavemente olorosas. Cansei-me de poetar sobre estrelas e a lua. Arre, por que continuar sendo esta coisa antiquada cheia de estrofes e rimas? Já passou o tempo de cobrar a minha parte. Se falar de rosas, falarei delas como falou, por exemplo, o poeta Jamil Almansur Haddad quando escreveu o verso "bundas que parecem rosas". Ter mais de setenta anos é ser inimputável. Não tenho imagem mais pela qual deva zelar e quem sabe me apliquem, no fim, a atenuante de chamar-me de escritor erótico. Não concorrerei mais a cargos públicos, e ser cronista à moda antiga já me cansou. Nada mais de falar de árvores, de flores, de bairros, de histórias edificantes (e paulificantes). Enquanto Seu Câncer não vem, cantarei quadris tomados pelo fogo do Inferno, lábios ávidos de saliva e sacanagem, pernas que aprisionam outras como tenazes, desmaios lúbricos, palavrões soando como cânticos no clímax do gozo, e rios imensos, leitosos, correndo de madrugada e arrastando-nos para a mais deleitosa de todas as danações.
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