sábado, 8 de outubro de 2016
As borboletas
Passou a sonhar todas as noites com borboletas imensas e belíssimas, que insinuavam poder levá-lo até o céu e além. De manhã, porém, quando ia ao jardim, as borboletas que via eram as de sempre, decepcionantemente pequenas. Quando caiu doente, de cama, já não era só à noite que as enormes borboletas vinham seduzi-lo. Uma delas, a mais insistente, às vezes se transformava numa aeromoça loiramente escandinava, que num inglês surpreendentemente compreensível o incitava a apressar-se. No sonho ele se entregava e partia, mas acabava acordando, frustrado. Como se fosse dele a culpa pelas partidas malogradas, as borboletas bruscamente o abandonaram. Certa manhã, dois meses depois, a doença cedeu e ele pôde sair da cama. Deixaram-no sentado, tomando ar no jardim. Quando foram buscá-lo para o almoço, ele estava chorando como uma criança. Imaginaram que estivesse emocionado pelo restabelecimento. Estava arrasado por se ver diante daquelas borboletas miúdas, incapazes de levá-lo além daquela vida prosaica, daqueles dias que só sabiam esticar-se indolentemente como cobras sob o sol.
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