terça-feira, 4 de outubro de 2011
Três ou quatro sílabas
A esse lugar, cujo endereço só a Morte saberá quando for preciso, ele não levará laptop e não terá rádio nem tevê. Será um exilado do mundo. Não quer saber mais das desgraças e das catástrofes, nem dos júbilos com que às vezes os deuses zombeteiros fingem compensá-las. Lerá e também escreverá, mas para ninguém. E, se ouvir alguma voz humana, que seja a de quem use a linguagem só para lhe levar algo - o mínimo - de que precisará, não para viver, mas para ir morrendo aos poucos. Que não haja nenhuma mulher por perto, nem mesmo a mais desprovida de poder e encanto. E, sobretudo, que as memórias do amor misericordiosamente se atenuem, até se apagar por completo. E que, se mesmo assim, na hora da morte, ele tiver a tentação de dizer ainda uma vez o nome que escravizou sua alma, que possam o sofrimento, a debilidade e a língua desabituada aos sons fazer soar esse nome como se fosse nada mais que o zumbido da mosca passeando pelo quarto ou como três ou quatro sílabas mais desenhadas nos lábios que ditas, inaudíveis entre as solenes palavras da extrema-unção.
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