sábado, 26 de janeiro de 2013
A última tentação
Estás sozinho, outra vez, e sozinho estarás até o fim. O mundo te tentou hoje, com a mais doce das tentações, e mostraste o que és: um velho. Não atendeste a campainha, foste para o mais remoto canto da casa e nem respiraste, para não denunciar tua presença. A campainha soou, soou, mas só ousaste mover-te depois de ouvires o som não mais na tua casa, mas na vizinha. Estás feliz agora, na tua covarde segurança de velho. Sentado no sofá, na obscuridade da tarde que se vai, tens orgulho de ti. Mesmo que a campainha volte a soar um dia, já sabes que conseguirás resistir, ainda que venhas a ter o ímpeto de, ouvindo o toque na casa vizinha, correr e gritar ei, eu estou aqui, tocaram na minha casa primeiro - como hoje tiveste. Mas correr com o quê? Com essas pernas que mal conseguem esperar o dia em que as ajeitarem horizontalmente, lado a lado, com o par de sapatos das grandes ocasiões, e elas não precisarem andar nunca mais?
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