segunda-feira, 25 de março de 2013
Na outra calçada
Há canções que amamos muito, que nos fizeram chorar e que, pela inconstância dos nossos sentimentos, acabamos esquecendo. Elas não se queixam, recolhem-se a um canto da memória e ali ficam, esperando o momento em que ressurgirão para nos mostrar como fomos ingratos com elas. O Loyola fala hoje no Estado de uma canção que mudou sua vida. Influenciado provavelmente pela leitura dessa história, tornei-me a vítima ideal para uma daquelas melodias que há tempo havia esquecido. Peguei-me a cantarolar Vous qui passez sans me voir. Era Charles Trenet quem a cantava, acho (preguiça de ir ao google). Estava saindo do supermercado. Olhei para a outra calçada e, embora os raios do sol se interpusessem entre mim e ela, vi uma moça bem moça, talvez até uma garota, que o feitiço da canção transformou imediatamente na mais bela mulher vista por mim em toda a vida. Além de estarmos em calçadas opostas, caminhávamos para lados contrários. Pus as sacolinhas com as compras no chão e voltei o rosto a tempo de vê-la ainda de frente. Sei que meus olhos suplicavam: um sorriso, por favor, pelo menos um sorriso. Mas ela se foi. Não custava ela ter sorrido para mim, embora não devesse ser nada encorajadora para ela a visão de um velho comido pelo tempo, erguendo as sacolas e retomando o caminho. Menina, moça, mulher, eu só queria um sorriso. Não lhe pediria nada disso que, quando a veem, os rapazes se põem a elogiar com o entusiasmo que você sempre causa.
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