quarta-feira, 6 de março de 2013

No jornal - 56 - Eduardo Martins, Walmir Venturini

Há palavras que não têm descanso. Além de designarem o que lhes cabe designar, são chamadas a todo instante, por ignorância ou preguiça de quem fala ou escreve, para substituir uma centena de outras. Correm de um lado para outro, esfalfam-se e, embora de vez em quando alguém de bom coração, um gramático ou um filólogo, tenha a bondade de advertir que elas estão sendo exploradas, o máximo que elas conseguem é uma trégua, depois da qual voltam a ser requisitadas. São as chamadas palavras-ônibus (do latim omnibus = para todos). Representam uma espécie de quebra-galhos. A mais famosa delas talvez seja coisa. Coisa é tudo: um objeto, uma comida, uma pessoa, uma engenhoca, uma mulher feia, uma mulher bonita, um treco, um troço, uma... coisa. Além de ser utilizada assim a torto e a direito em sua forma original, ela deu origem a um verbo, coisar, que também significa tudo: fazer, realizar, terminar, prejudicar, ter relação sexual, e por aí afora. Coisa e coisar, pela sua origem simples, ainda são toleráveis. Uma palavra-ônibus que não merece esse privilégio é pilotar. Tudo se pilota, hoje: uma festa, uma reunião, um almoço, uma reconciliação, um baile de carnaval, até mesmo um carro ou um avião. Essa palavra é usada com tanta frequência no(s) jornal(ais) que pode passar a errônea impressão de ser um termo técnico da área social. Que falta faz Eduardo Martins, que tão atento era a esses modismos, denunciando-os com rigor no seu Manual de redação e estilo e em separatas que afixava no mural da redação. Walmir Venturini também não tolerava essas baboseiras que surgem periodicamente com força de vírus. Eu não poderia dizer como anda a linguagem no jornal, mas sei que estaria muito melhor com Eduardo e com Walmir - tidos no seu tempo, por alguns redatores, como costumam ser tidos todos os que cobram um trabalho melhor: um tantinho chatos.

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