segunda-feira, 13 de maio de 2019
Arrependimento
Só uma vez se deitou com a mulher que tinha um sinal de bala na coxa esquerda, e não a teria escolhido se soubesse desse detalhe. Isso foi há três décadas, ou mais. Por uma dessas perversões que a idade traz, agravada por sua fixação em palavras, nas suas transformações semânticas e em seus embustes, hoje ele se lembrou dela, dos seus lábios borrados de escarlate, da sua voz de virago, da coxa e da bala, que ela lhe exibiu naquela noite como um trunfo sexual. Só hoje ele reconhece a força desse trunfo e se excita reminiscentemente. Não pela bala em si, nem pela marca, mas porque de repente, agora, ele pensa no que não lhe ocorreu então: que uma bala, enquanto não se conhecer sua identidade, pode muito bem ser chupada.
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