segunda-feira, 4 de março de 2013

Burro não é tolo

Uma tarde, na extinta revista Visão, Luiz Carlos Cardoso - hoje um notável romancista e autor de peças premiadíssimas - fazia comigo a revisão de um texto sobre personagens históricos do Brasil. Em determinada passagem, uma frase soou como se fizesse parte do Samba do crioulo doido, de Stanislaw Ponte Preta: o Duque de Caxias empenhava-se na Guerra do Paraguai sob as ordens de Getúlio Vargas. Luiz Carlos e eu fizemos a correção sem avisar nada ao redator, porque o erro era tão rotundo que poderia envergonhá-lo. Quando a revista foi publicada, o redator, muito zangado, veio nos falar. A causa do seu descontentamento não era o Duque de Caxias nem Getúlio Vargas. Ele nos censurava por uma palavra que havíamos substituído. Lá pelo décimo ou vigésimo parágrafo, ele dizia que o Marquês de Pombal não era burro. Como essa palavra, "burro", não se coadunava com o tom cerimonioso do texto, nós a alteramos para "tolo". Luiz Carlos e eu nos olhamos e sorrimos. Estávamos habituados, como os revisores sempre estiveram, a aceitar as culpas que nos jogavam sobre as costas. Se falássemos do Duque de Caxias e de Getúlio Vargas, talvez o redator se zangasse mais ainda e acabasse nos provando que o duque e o presidente-ditador tinham sido grandes amigos, jogavam gamão e compartilhavam uma garçonnière.

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