"É curioso as pessoas acharem que arrumar uma cama é exatamente a mesma coisa qua arrumar uma cama, que estender a mão é sempre a mesma coisa que estender a mão, que abrir uma lata de sardinhas é abrir até o infinito a mesma lata de sardinhas. 'Tudo é excepcional', pensa Pierre alisando de modo desajeitado o cobertor azul gasto. 'Ontem chovia, hoje teve sol, ontem eu estava triste, hoje Michèle virá. A única coisa invariável é que jamais conseguirei que esta cama tenha um aspecto apresentável.' Não faz mal, as mulheres gostam da desordem do seu quarto de solteiro, podem sorrir (a mãe aparece em todos os dentes) e arrumar as cortinas, mudar de lugar um vaso ou uma cadeira, dizer só mesmo você poderia ter a ideia de botar esta mesa onde não há luz. Michèle dirá provavelmente coisas assim, andará tocando e movendo livros e abajures, e ele a deixará olhando-a o tempo todo, esticado na cama ou afundado no velho sofá, olhando-a através da fumaça de um Gauloise e desejando-a."
(De As armas secretas, tradução de Eric Nepomuceno, publicado pela José Olympio Editora.)
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