"Havia dias onde tudo se confundia, as pensionárias com as noviças, as noviças com as religiosas; onde tomávamos juntas chá, café, chocolate, licores; em que rezávamos o ofício com a mais indecente rapidez; em pleno tumulto, a fisionomia da superiora muda bruscamente, soa o sino; todas se fecham, e se retiram, segue-se profundo silêncio ao alarido, ao tumulto e aos gritos, seria de crer que tudo morreu subitamente. Uma religiosa comete então a mais pequena falta? Ela a faz vir à sua cela, trata-a com dureza, ordena-lhe que se dispa e se aplique vinte golpes de disciplina; a irmã obedece, despe-se, toma a disciplina, macera-se; mal aplica os primeiros golpes, no entanto, a superiora, tornando-se compadecida, arranca-lhe o instrumento da penitência, põe-se a chorar, diz que é bem infeliz por ter que punir, beija-lhe a fronte, os olhos, a boca, os ombros; acaricia-a, louva-a. 'Mas que pele doce e branca! que bela carnadura! que lindo pescoço! que lindo birote!... Irmã Sainte-Augustine, és tola de ter vergonha; deixa cair esse linho; sou mulher e tua superiora. Ora, que seio formoso! que firmeza! e eu consentiria que o castigo o dilacerasse! Não, não, de modo nenhum...' Beija-a ainda, levanta-a, veste-a ela própria, diz-lhe as coisas mais doces, dispensa-a dos ofícios, manda-a para sua cela de volta."
(De A religiosa, tradução de Antônio Bulhões e Miécio Tati, publicado pela Abril.)
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