quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

"Mapa", de Wislawa Szymborska

"Plano como a mesa
na qual está colocado.
Por baixo dele nada se move
nem busca vazão.
Sobre ele - meu hálito humano
não cria vórtices de ar
e toda a sua superfície
deixa em silêncio.

Suas planícies, vales são sempre verdes,
os planaltos, montanhas amarelos e marrons
e os mares, oceanos são de um azul amistoso
nas margens rasgadas.

Tudo aqui é pequeno, próximo e acessível.
Posso tocar os vulcões com a ponta da unha,
acariciar os polos sem luvas grossas.
Com um olhar posso
abarcar cada deserto
junto com um rio situado logo ao lado.

As selvas são assinaladas com algumas árvores
entre as quais seria difícil se perder.

No oriente e ocidente,
acima e abaixo do equador -
como poeira assentou o silêncio
e em cada partícula pessoas vivem lá suas vidas.
Valas comuns e súbitas ruínas
não cabem messe quadro.

Gosto dos mapas porque mentem.
Porque não dão acesso à verdade crua.
Porque magnânimos e bem-humorados
abrem-me na mesa um mundo
que não é deste mundo."

(De Um amor feliz, tradução de Regina Przybycien, Companhia das Letras.)

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