terça-feira, 3 de maio de 2011

Rosa dos ventos

Se segues o rumo norte,
O que te espera é a peste.
No sul, no leste e no oeste,
O que te espera é a morte.

Saudosismo

O que no computador
Te disse de modo terno
Teria bem mais valor
Se escrito no teu caderno.

Hoje

Amor, não são essas, frias,
As mãos com que me afagavas,
Não era assim que me amavas,
Nem isso o que me dizias.

Que sobre o sonho frustrado
E o desencanto sofrido
Assente o pó abençoado
Da remissão e do olvido.

Rima

Rimar-te sempre com dor
Não é contigo desfeita.
É a melhor rima, é a perfeita,
É a que mereces, amor.

Cristaleiras

Vi Luzes da Ribalta, de Chaplin, pelo menos vinte vezes e falei sobre o filme mais umas vinte. E, sempre que falo, exagero um tanto e digo que o vi sessenta vezes, setenta. É pouco: sinto que deveria tê-lo visto muitas vezes mais. Aquilo é tão dramaticamente, maravilhosamente, lancinantemente piegas quanto aquelas cristaleiras em que as famílias antigas, à falta de cristais, acabavam colocando rústicas poncheiras, copos opacos, caixinhas de música e bibelôs que, tendo sofrido alguma mutilação por desastres de manuseio e pertencendo à categoria de objetos de estimação, ali eram encerrados. Bailarinas sem pés, moinhos sem pás e outras relíquias domésticas eram postas na cristaleira com a estratégica e piedosa preocupação de que seus defeitos se exibissem mais à parede que aos olhos dos jovens que, nas festas de família, paravam diante da poncheira para novamente serem informados de que aquele soldado com o capacete roído pelo tempo e aquele cachorro com a orelha lascada tinham sido presenteados à vovó em 1910 ou poucos meses antes da I Guerra Mundial.

Lição

O que os jovens escritores deveriam saber, como primeira lição, é que não se pode ser Machado de Assis com vinte ou trinta anos. Nem com setenta.

Dois em um

Arrependo-me de tantos versos capengas, de tantos poemas estropiados, de tudo que escrevi e, principalmente, de tudo aquilo que poderia ter escrito e fiquei prometendo a mim mesmo escrever, sabendo que jamais conseguiria. Fui um poeta inepto enganando um leitor tolo.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Último voo

Pudéssemos, em nosso derradeiro dia, ser abençoados com a leveza de um passarinho, o menor de todos, e voássemos até o ponto mais acolhedor do mais distante dos mares, onde flutuássemos por um instante e nos deixássemos cair lentamente, livres do peso de nossas aspirações e nossas desgraças, misturando-nos à espuma e às ondas... Dizem que a alma é assim, leve. Que seja. Ave, alma.

domingo, 1 de maio de 2011

Domingo

Domingo claro, que cantas
A majestade da vida,
Tu tentas, mas não espantas
A convicção do suicida.