quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Quatro poemas de Paulo Leminski

"um dia
a gente ia ser homero
a obra nada menos que uma ilíada

depois
a barra pesando
dava pra ser aí um rimbaud
um ungaretti um fernando pessoa qualquer
um lorca um éluard um ginsberg

por fim
acabamos o pequeno poeta de província
que sempre fomos
por trás de tantas máscaras
que o tempo tratou como a flores."

                    ***

"um poema
que não se entende
é digno de nota

a dignidade suprema
de um navio perdendo a rota."

                    ***

"dois loucos no bairro

um passa os dias
chutando os postes para ver se acendem

o outro as noites
apagando palavras
contra um papel branco

todo bairro tem um louco
que o bairro trata bem
só falta mais um pouco
pra eu ser tratado também."

                  ***

"eu queria tanto
ser um poeta maldito
a massa sofrendo
enquanto eu profundo medito

eu queria tanto
ser um poeta social
rosto queimado
pelo hálito das multidões

em vez
olha eu aqui
pondo sal
nesta sopa rala
que mal vai dar para dois."

                  ***

"en la lucha de clases
todas las armas son buenas
piedras
noches
poemas."

(Do livro Toda poesia, publicado pela Companhia das Letras.)


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