Falei outro dia, ligeiramente, do haicai, a mais famosa expressão da poética japonesa. O haicai tem, no Brasil, quem o cultue e cultive. Como aconteceu em tantos outros casos, essa forma de arte passou aqui por modificações, algumas até radicais. Millôr Fernandes, por exemplo, usa o haicai para expressar seu refinado humor. Sânzio de Azevedo, poeta cearense, tem alguns haicais primorosos. Mas talvez o mais ilustre de todos os fazedores de haicais no Brasil seja Guilherme de Almeida, que foi também quem lhe deu roupagem brasileira, sugerindo a forma hoje consagrada. São três versos. O primeiro e o terceiro têm cinco sílabas poéticas, e um rima com o outro. O segundo verso, de sete sílabas poéticas, tem uma rima interna (a segunda sílaba rima com a sétima). No seu haicai Infância pode-se ver como funciona o esquema:
Um gosto de amora
Comida com sol: a vida
Chamava-se agora.
Andei fazendo haicais na adolescência, quando me considerava ainda digno de ser tocado pela grande poesia. Vão aqui dois deles, com as devidas desculpas:
ADEUS
Navio a zarpar.
Os lenços, pombos suspensos,
Anseiam voar.
VIDA
Na areia teu nome:
Momento que o tempo, vento
Contínuo, consome.
Para terminar este bate-papo sobre poesia, e com desculpas ainda mais fortes, vai aí uma quadrinha que fiz hoje, caminhando pelo meu querido bairro, o Jardim da Saúde:
Quando lá fora o poeta
Numa rima vacilou,
A moça, nada discreta,
Sua janela fechou.
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