sábado, 29 de dezembro de 2012

Um poema de Czeslaw Milosz

"PREFÁCIO

Tu a quem não pude salvar
Escuta-me.
Tenta compreender este simples discurso porque tenho
vergonha de outro.
Juro que em mim não existem
as magias do verbo.
Te falo em silêncio como nuvem ou árvore.

O que me fazia forte, para ti foi letal.
Confundiste o adeus a uma época com o começo de outra,
A inspiração do rancor com a beleza lírica,
A força bruta com a forma perfeita.

Eis o vale dos rasos rios polacos. E uma ponte imensa
Furando a neblina branca. Eis a cidade quebrada,
E o vento arrasta o pio das gaivotas sobre o teu sepulcro
Quando eu estou falando contigo.

Que é a poesia que não salva
Nem as nações nem a gente?
Uma trama de mentiras oficiais,
Uma canção de bêbados cujas gargantas podiam ser
cortadas de repente.
Uma leitura para meninas de colégio.

Que eu quisesse a boa poesia sem poder fazê-la,
Que eu tardiamente entendesse o seu fim redentor,
Isto e só isto é salvação."

(Do livro Quatro poetas poloneses, tradução de Henryk Siewierski e José Santiago Naud, editado pela Secretaria de Estado da Cultura do Governo do Paraná, com apoio do Consulado Geral da República da Polônia e do Ministério da Cultura da República da Polônia.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário