Os últimos dias são
Aqueles em que sem pressa
Vamos cobrar a promessa
De paz e de redenção.
Já longe está o verão
E nos apraz andar nessa
Trilha onde o inverno começa
E se aquieta o coração.
Tudo é tão plácido agora,
Tão diferente de outrora,
Tão lento e confortador,
Que já mentira parecem
Os dias, que já se esquecem,
De presunção e clamor.
quinta-feira, 31 de dezembro de 2015
"Numa carruagem de comboio", de Robert Louis Stevenson
"Mais rápido do que as fadas, mais rápido do que as bruxas,
Pontes e casas, sebes e regatos;
Movendo-se como as tropas num campo de batalha,
Os cavalos e o gado cruzam os prados:
O cenário das colinas e planícies
Desaparece através da chuva;
E novamente, num abrir e fechar de olhos,
Coloridas estações apitam quando passamos.
Eis uma criança que trepa
Pelas trepadeiras;
Eis um vagabundo que contempla;
Eis o grande verde das margaridas!
Eis a carroça que vai pela estrada
Pesadamente com o homem e a carga;
Eis um moinho aqui e ali um rio:
Tudo é como um clarão e para sempre desaparece!"
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Pontes e casas, sebes e regatos;
Movendo-se como as tropas num campo de batalha,
Os cavalos e o gado cruzam os prados:
O cenário das colinas e planícies
Desaparece através da chuva;
E novamente, num abrir e fechar de olhos,
Coloridas estações apitam quando passamos.
Eis uma criança que trepa
Pelas trepadeiras;
Eis um vagabundo que contempla;
Eis o grande verde das margaridas!
Eis a carroça que vai pela estrada
Pesadamente com o homem e a carga;
Eis um moinho aqui e ali um rio:
Tudo é como um clarão e para sempre desaparece!"
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
quarta-feira, 30 de dezembro de 2015
Saudade
Às vezes gostaria de fazer a ela perguntas como "O que você pensa das fotos de Vivian Maier?". É uma das coisas que perdi.
Marcadores:
Literatura
Calafrio
Quando, num livro de terror, uma exclamação encontra outra, as duas ficam com os cabelos em pé.
Marcadores:
Literatura
Stop (para Marcelo Mirisola)
Ia escrever a história de uma mariposa que me apareceu agora à noite em casa, mas desisti em nome do decoro literário quando logo na primeira frase surgiu o verbo revolutear.
Marcadores:
Literatura
SOS
Chamado, o serviço de reparos descobriu que o vazamento de água na casa tinha origem na estante, mais precisamente na área da poesia da era romântica, e era provocado pelas reticências no final dos versos, que, mal rosqueadas, deixavam escoar, cada uma, trezentos pingos ao invés de três.
Marcadores:
Literatura
Nada a ver
Prosódia é um nome horroroso que deram a um conjunto de coisas bonitas como tom, timbre, som, intensidade e ritmo.
Marcadores:
Literatura
Letra
A primeira vez que li a palavra prepúcio, pensei que se tratasse de uma autoridade eclesiástica. Se me perdoarem o lambdacismo, foi uma glande falha.
Marcadores:
Literatura
Na mão
Ele nunca beijou a mão dela, quando podia. Lastima-se por isso. Se o tivesse feito, talvez hoje ela, esteja onde estiver, sentisse uma coceguinha reminiscente e sorrisse, sussurrando: ah, aquele sujeito, que maluquinho ele era, às vezes chego a ter saudade.
Marcadores:
Literatura
De um a quatro
Ele abriu o coração para ela cedo demais. Já na primeira ou na segunda vez ela o conhecia inteiramente. Na terceira e na quarta vez ela já sentia tédio. Não houve quinta vez.
Marcadores:
Literatura
Mario Quintana
Fazer poesia era, para Mario Quintana, um ato natural. Consistia simplesmente em respirar com uma caneta na mão.
Marcadores:
Literatura
Sinopse
Sou um velho que se deixou enganar por um menino. Isso aconteceu há mais de seis décadas, mas lembro que ele se chamava Raul, também, e me fez acreditar que meu destino era a literatura.
Marcadores:
Literatura
Seis versos de Friedrich Hölderlin
"Por que se calam também os antigos e sacros teatros?
Por que não se anima a dança ritual?
Por que é que um Deus não marca, como outrora, a fronte do homem,
Não imprime o seu selo, como dantes, naquele que escolheu?
Talvez ele próprio tenha vindo e assumido forma humana
E tenha consumado e encerrado, consolador, a festa celeste."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Por que não se anima a dança ritual?
Por que é que um Deus não marca, como outrora, a fronte do homem,
Não imprime o seu selo, como dantes, naquele que escolheu?
Talvez ele próprio tenha vindo e assumido forma humana
E tenha consumado e encerrado, consolador, a festa celeste."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
terça-feira, 29 de dezembro de 2015
Soneto do perdão imerecido
Quem se mostrará clemente,
Quem nos dará o perdão,
Se ainda este sangue inocente
Nos escorre pela mão?
Quem nos será complacente,
Quem nos terá compaixão,
Se agimos tão torpemente,
Sem lógica e sem razão?
Pedimos o amor, clamamos
Por ele e, quando o tivemos,
Depois de usá-lo o matamos.
Quem irá nos compreender
Depois do que nós fizemos?
Quem irá nos absolver?
Quem nos dará o perdão,
Se ainda este sangue inocente
Nos escorre pela mão?
Quem nos será complacente,
Quem nos terá compaixão,
Se agimos tão torpemente,
Sem lógica e sem razão?
Pedimos o amor, clamamos
Por ele e, quando o tivemos,
Depois de usá-lo o matamos.
Quem irá nos compreender
Depois do que nós fizemos?
Quem irá nos absolver?
Marcadores:
Literatura
Um poema de Robert Louis Stevenson
"Conheces o rio que há perto de Grez,
Esse rio profundo e claro?
Entre os lírios das suas margens,
O velho rio ainda corre
E desce das represas geladas.
Velho como o famoso Reno,
Corre claro e rápido,
Corre sem se deter por campos e cidades,
Do Sul ao Norte, sobe e desce,
Do passado para o presente.
O meu amor nasceu junto a ele;
E agora, embora ao longe,
O meu solitário espírito ouve o murmúrio
Da água à volta dos pilares
Da ponte de Grez.
Possa o meu amor conservar em vida,
Para sempre, semelhante paz;
Que esse amor nunca envelheça
Mas, claro e puro como um manancial,
Seja abençoado pela graça."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Esse rio profundo e claro?
Entre os lírios das suas margens,
O velho rio ainda corre
E desce das represas geladas.
Velho como o famoso Reno,
Corre claro e rápido,
Corre sem se deter por campos e cidades,
Do Sul ao Norte, sobe e desce,
Do passado para o presente.
O meu amor nasceu junto a ele;
E agora, embora ao longe,
O meu solitário espírito ouve o murmúrio
Da água à volta dos pilares
Da ponte de Grez.
Possa o meu amor conservar em vida,
Para sempre, semelhante paz;
Que esse amor nunca envelheça
Mas, claro e puro como um manancial,
Seja abençoado pela graça."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
segunda-feira, 28 de dezembro de 2015
Soneto de todas as juras
O que de pior o amor tem
É que aquelas suas juras
Nunca está certo ninguém
Se são puras ou perjuras.
Têm sempre aparência igual
E não se pode saber
Se são do tipo banal
Ou nelas se pode crer.
Podia ser diferente,
Podia ser simplesmente
Que existisse algum lugar
Em que as promessas sentidas,
Bem como aquelas fingidas,
Pudessem todas vingar.
É que aquelas suas juras
Nunca está certo ninguém
Se são puras ou perjuras.
Têm sempre aparência igual
E não se pode saber
Se são do tipo banal
Ou nelas se pode crer.
Podia ser diferente,
Podia ser simplesmente
Que existisse algum lugar
Em que as promessas sentidas,
Bem como aquelas fingidas,
Pudessem todas vingar.
Marcadores:
Literatura
Conforto
Jogaram o gato dentro da caçamba e, por uma dessas ironias que os escritores costumam atribuir ao destino, ele caiu esparramado numa poltrona tão velha e morta quanto ele.
Marcadores:
Literatura
Dois tancas de Takuboku Ishikawa
"Naquele braço, a marca do meu beijo,
inalcançável
pedra branca preciosa."
***
"Deitado de bruços na duna
com um passado distante
a dor do meu primeiro amor."
(De Tankas, tradução de Masuo Yamaki e Paulo Colina, publicação da Roswitha Kempf Editores.)
inalcançável
pedra branca preciosa."
***
"Deitado de bruços na duna
com um passado distante
a dor do meu primeiro amor."
(De Tankas, tradução de Masuo Yamaki e Paulo Colina, publicação da Roswitha Kempf Editores.)
Marcadores:
Literatura
domingo, 27 de dezembro de 2015
Lembrança
Tão promíscua ela era que, quando ele lhe beijava o ventre, era como se estivesse lambendo mãos salgadas de marinheiros.
Trivial
Um dia te lembrarás
De alguma coisa que fiz,
E é claro que tu rirás,
Como sempre de mim ris.
De alguma coisa que fiz,
E é claro que tu rirás,
Como sempre de mim ris.
Soneto da lógica que há no sofrimento
Em tudo há sempre um sentido,
Um nexo, um significado,
Às vezes subentendido,
Às vezes explicitado.
Um grito da alma, um gemido,
Um choro descontrolado,
Tudo deve ser ouvido
E nada menosprezado.
Tudo, se observarmos bem,
É sempre lógico e tem
A sua razão de ser.
Se as desgraças nos consomem,
Não nos espantemos. O homem
Nasceu para padecer.
Um nexo, um significado,
Às vezes subentendido,
Às vezes explicitado.
Um grito da alma, um gemido,
Um choro descontrolado,
Tudo deve ser ouvido
E nada menosprezado.
Tudo, se observarmos bem,
É sempre lógico e tem
A sua razão de ser.
Se as desgraças nos consomem,
Não nos espantemos. O homem
Nasceu para padecer.
Um poema de Robert Louis Stevenson
"Longe, no mar, há uma ilha
Onde o crepúsculo
É uma alameda de agitadas palmeiras
Desenhadas no sol.
E ao longo da costa e dos seus recifes
Ondas azuis reluzem e desfazem-se.
Aí irei, parece-me,
Quando tudo estiver terminado.
Não tenho nenhum castelo em Espanha,
Nenhuma ilha no pensamento,,
Aonde voltar e partir outra vez
Quando a vida me castigar.
Ergue-te, indolente alma! Procura longe daqui
O nosso bosque na montanha,
Ou aproxima-te da ilha encantada,
Chega à baía que desejaste."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim.)
Onde o crepúsculo
É uma alameda de agitadas palmeiras
Desenhadas no sol.
E ao longo da costa e dos seus recifes
Ondas azuis reluzem e desfazem-se.
Aí irei, parece-me,
Quando tudo estiver terminado.
Não tenho nenhum castelo em Espanha,
Nenhuma ilha no pensamento,,
Aonde voltar e partir outra vez
Quando a vida me castigar.
Ergue-te, indolente alma! Procura longe daqui
O nosso bosque na montanha,
Ou aproxima-te da ilha encantada,
Chega à baía que desejaste."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim.)
sábado, 26 de dezembro de 2015
Pecado
Com o tempo a arte, em mim, foi se transformando cada vez mais em culpa e cada vez menos em redenção.
Alívio
Perdeu tudo que de melhor possuiu. Abençoa-se porque jamais quis ter um cachorro, ou um passarinho. Não suportaria vê-los morrer. A fé, a esperança e o amor não uivam nem piam aflitamente quando agonizam.
Continha
Talvez um beijo, talvez
Mais um (por que não?) depois.
E logo após esses dois
Mais um para somar três.
Mais um (por que não?) depois.
E logo após esses dois
Mais um para somar três.
Fraque
É um escritor clássico. Nunca introduz um pardal em um texto, se puder fazer voar nele uma cotovia.
"Skerrymore: a comparação", de Robert Louis Stevenson
"Aqui está tudo cheio de sol, e quando a indolente gaivota
Roça a superfície verde da erva, a sua asa
Desfolha rosas; aqui se constrói a casa
Com argila moldada por artistas e
Pinheiros cortados tão fino
Que até os garotos os podiam quebrar. Mas aí
Em granito eterno da ilha viva
E em puro ferro, ergue-se uma torre
Que dos alicerces úmidos até à sua coroa
De cintilante vidro, se impõe, batida pelos ventos,
Imóvel, imortal, eminente."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Roça a superfície verde da erva, a sua asa
Desfolha rosas; aqui se constrói a casa
Com argila moldada por artistas e
Pinheiros cortados tão fino
Que até os garotos os podiam quebrar. Mas aí
Em granito eterno da ilha viva
E em puro ferro, ergue-se uma torre
Que dos alicerces úmidos até à sua coroa
De cintilante vidro, se impõe, batida pelos ventos,
Imóvel, imortal, eminente."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
sexta-feira, 25 de dezembro de 2015
Soneto dos nossos momentos finais
Nós temos algum tempo ainda
Enquanto o sol lentamente
Faz sua rota descendente
E enquanto o dia não finda.
São os momentos finais.
Se falar ainda queremos,
Que então agora falemos,
Porque depois nunca mais.
Depois de usar-nos, o amor,
Nosso adorado senhor,
Cansado de nos usar,
Dirá o que a todos diz:
"Boa sorte, seja feliz",
E nos mandará pastar.
Enquanto o sol lentamente
Faz sua rota descendente
E enquanto o dia não finda.
São os momentos finais.
Se falar ainda queremos,
Que então agora falemos,
Porque depois nunca mais.
Depois de usar-nos, o amor,
Nosso adorado senhor,
Cansado de nos usar,
Dirá o que a todos diz:
"Boa sorte, seja feliz",
E nos mandará pastar.
Marcadores:
Literatura
Mario Quintana
Mario Quintana me faz pensar num menino de uns dez ou onze anos, possivelmente um prodigioso violinista chinês, que, no fim de um admirável concerto, depois de se curvar reverentemente uma, duas, dez vezes para agradecer os aplausos, reassume seu direito à infância e às travessuras e, sob um oh de espanto, exibe escandalosamente a língua ao público e conclui com uma aparatosa banana.
Marcadores:
Literatura
A causa
Perguntarão de que morremos.
Alguém responderá baixinho,
por pudor. Mas
um desses inconvenientes
presentes em todo lugar
dirá, quase a gritar:
É mesmo? Não acredito.
Então foi por amor
que se matou esse cretino?
Alguém responderá baixinho,
por pudor. Mas
um desses inconvenientes
presentes em todo lugar
dirá, quase a gritar:
É mesmo? Não acredito.
Então foi por amor
que se matou esse cretino?
Marcadores:
Literatura
Cançãozinha
Houve um tempo
em que pensavas em mim
com sentimento
Houve um tempo
em que pensavas em mim
todo o tempo
Houve um tempo
em que mesmo quando não era
era sempre primavera.
em que pensavas em mim
com sentimento
Houve um tempo
em que pensavas em mim
todo o tempo
Houve um tempo
em que mesmo quando não era
era sempre primavera.
Marcadores:
Literatura
Uma frase de Balzac
"Não existe paixão que não se torne um pouco desonesta com o decorrer do tempo."
(De Ferragus, tradução de William Lagos, edição da L&PM.)
(De Ferragus, tradução de William Lagos, edição da L&PM.)
Marcadores:
Literatura
quinta-feira, 24 de dezembro de 2015
Natal (para o Gianluca, a Nicole, a Bia, a Duda e o cachorro chamado Cisquinho)
Um passarinho bobo
começou a cantar
e os outros todos
vieram acompanhar
Cantaram toda a manhã
a tarde inteira
até o fim do dia
Quando se cansaram
perguntaram ao passarinho tolo
a razão daquela cantoria
Ele disse hoje é Natal
hoje é alegria
e todos esqueceram a fadiga
e recomeçaram a cantar.
começou a cantar
e os outros todos
vieram acompanhar
Cantaram toda a manhã
a tarde inteira
até o fim do dia
Quando se cansaram
perguntaram ao passarinho tolo
a razão daquela cantoria
Ele disse hoje é Natal
hoje é alegria
e todos esqueceram a fadiga
e recomeçaram a cantar.
Marcadores:
Literatura
Moção
Para declarar minha alegria
não há quorum
nem nunca haverá
per omnia saecula saeculorum.
não há quorum
nem nunca haverá
per omnia saecula saeculorum.
Marcadores:
Literatura
Um poema de Robert Louis Stevenson
"Os meus olhos estavam dispostos a conhecer-te, e o meu coração
A amar-te. Fui teu imediatamente
Por inteiro, para sempre, teu
Honradamente, com pura intenção,
Com excessivo amor e alegre cuidado:
Assim fui, assim sou, assim serei.
Conheci a tua generosidade, a tua verdade, conheci-te
E aos piedosos companheiros: ouvi-te falar
Com adequadas palpitações. Sobre a corrente,
Profunda, rápida e clara, os lírios flutuavam; os peixes
Corriam através das sombras. Aí, tu e eu
Líamos a Bondade nos nossos olhos e assim nos unimos."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
A amar-te. Fui teu imediatamente
Por inteiro, para sempre, teu
Honradamente, com pura intenção,
Com excessivo amor e alegre cuidado:
Assim fui, assim sou, assim serei.
Conheci a tua generosidade, a tua verdade, conheci-te
E aos piedosos companheiros: ouvi-te falar
Com adequadas palpitações. Sobre a corrente,
Profunda, rápida e clara, os lírios flutuavam; os peixes
Corriam através das sombras. Aí, tu e eu
Líamos a Bondade nos nossos olhos e assim nos unimos."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
quarta-feira, 23 de dezembro de 2015
Vida passada
Não me importaria ter sido um rei ou um lacaio, um escritor famoso ou um personagem secundário. Me bastaria ter sido, ter morrido, estar longe destes dias que parecem nascer apenas para atormentar a alma, como um urubu comendo sem pressa as vísceras de um cordeiro ainda não inteiramente morto.
Marcadores:
Literatura
Um trecho de "Ferragus", de Balzac
"Essa mulher lhe parecia realmente digna de inspirar um desses amores platônicos, que surgem como flores brotadas de ruínas sanguinolentas através da história violenta da Idade Média; digna de ser secretamente a inspiradora de todas as ações heroicas de um jovem oficial; um amor tão elevado e tão puro quanto o céu de um azul imaculado; um amor sem esperança, mas que nos prende firmemente, porque é o amor que não nos pode enganar, nem iludir; um amor cheio de gozos reprimidos, sobretudo nessa idade em que o coração é mais cheio de ardor, a imaginação mais aguçada e os olhos de um homem percebem o mundo à sua volta da forma mais clara."
(Tradução de William Lagos, publicação da L&PM.)
(Tradução de William Lagos, publicação da L&PM.)
Marcadores:
Literatura
terça-feira, 22 de dezembro de 2015
Impedimento
Considero-me cada dia mais indigno de lidar com a poesia, como se fosse um velho leproso cuidando de uma roseira.
Marcadores:
Literatura
Antídoto
Reler Dostoiévski, sempre que tivermos novamente a impressão de ver ouro em nossas frases.
Marcadores:
Literatura
Hábito
Com o tempo, você se habitua às suas derrotas e passa a ter até alguma estima por elas, como se fossem um bando de gatinhos aleijados.
Marcadores:
Literatura
Um poema de Robert Louis Stevenson
"Os infinitos céus resplandecentes
Brilhavam, e vi na noite
Incontáveis e angelicais estrelas
Derramando mágoa e luz.
Vi-as na sua lonjura celestial,
Mudas, brilhantes, mortas,
E as ociosas estrelas da noite
Mais amadas do que o pão.
Noite após noite na minha dor
Contemplei as estrelas sobre o mar,
Até que, no meio das trevas,
Uma estrela desceu até mim."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Brilhavam, e vi na noite
Incontáveis e angelicais estrelas
Derramando mágoa e luz.
Vi-as na sua lonjura celestial,
Mudas, brilhantes, mortas,
E as ociosas estrelas da noite
Mais amadas do que o pão.
Noite após noite na minha dor
Contemplei as estrelas sobre o mar,
Até que, no meio das trevas,
Uma estrela desceu até mim."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
segunda-feira, 21 de dezembro de 2015
Jurássicos
Um soneto, fora aqueles três ou quatro de Camões, aqueles dois ou três de Shakespeare, aqueles dois do Vinícius e aquele único do Bocage, são o que são: um monte de penduricalhos luminosos em catorze galhos, como uma árvore de Natal na sala de uma associação de caridade, com as bexigas ostentando o nome dos benfeitores.
Marcadores:
Literatura
Tática
Ele a beijará muito, ele a beijará mais, embora depois de cada beijo, como agora, ela se recuse ainda com maior intensidade a lhe conceder algo mais que isso. Ele a beijará muito, ele a beijará mais, até que o último beijo acalme sua espasmódica luxúria.
Marcadores:
Literatura
Mormaço
Toda vez que ele diz amor, as outras palavras da frase assumem uma mornidão ébria, como a das tardes em que as gaivotas cochilam voando sobre o mar.
Marcadores:
Literatura
Brisa
Quando ele lhe sopra os pelinhos ruivos, ela sempre fecha os olhos. Ele então sopra mais levemente, mais espaçadamente, como se não soprasse, para que ela só desperte do êxtase depois de ser toda consumida por ele.
Marcadores:
Literatura
Canto
O amor é um cordeiro triturado por uma sucuri. Quanto mais ela o aperta, mais convincente se torna seu canto.
Marcadores:
Literatura
Forma
Por quê e para quê são perguntas que a arte nunca deveria fazer. Ocupar-se com o como deveria ser sua única e legítima preocupação.
Marcadores:
Literatura
Odisseu
A modernidade
é a pátria da celeridade
O que para ulisses
foi uma odisseia foi um
passeio para leopold bloom.
é a pátria da celeridade
O que para ulisses
foi uma odisseia foi um
passeio para leopold bloom.
Marcadores:
Literatura
Um poema de Robert Louis Stevenson
"Aos amigos em casa, aos solitários, aos admirados, aos perdidos,
Aos idosos cordiais, aos jovens adoráveis, a maio,
O belo, ao amado dezembro,
Aos do horizonte azul das minhas ilhas verdes,
Aos dos cumes longínquos eu,
O que não esquece, tudo isto dedico."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Aos idosos cordiais, aos jovens adoráveis, a maio,
O belo, ao amado dezembro,
Aos do horizonte azul das minhas ilhas verdes,
Aos dos cumes longínquos eu,
O que não esquece, tudo isto dedico."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
domingo, 20 de dezembro de 2015
Dedução
Encontrando a estante molhada na letra V, não custei a descobrir o culpado: Vinte mil léguas submarinas.
Menu
Para poupar Machado, Flaubert e Virginia Woolf, intercalei na estante, para as traças, manuais de gastronomia.
Soberba
Incomoda-me a desfaçatez com que os defuntos, mesmo os de primeiro grau, costumam nos ignorar.
Cotação do dia
Ele julga ser alguém que, tendo ido visitar um parente no cemitério em 2010, jamais encontrou o portão de saída.
Epifania
A beleza há de ser como uma fulguração súbita e única, um momento que absolva toda a treva anterior e justifique toda a treva futura.
Gato (para a Nicole, a Duda e o Gianluca)
Um gato é como um arco-íris. Nada lhe deve em beleza, acomoda-se melhor num sofá ou no colo e tem a vantagem de saber miar.
"Eu, a quem Apolo visitou", de Robert Louis Stevenson
"Eu, a quem Apolo visitou,
Ou fingiu visitar, agora, ao acabar o meu dia,
Anseio o repouso; não conhecer
O cansaço das mudanças, não ver
As incomensuráveis areias dos séculos
Beberem a embranquiçada tinta, nem ouvir o alto som
Da tumultuosa música das gerações."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Ou fingiu visitar, agora, ao acabar o meu dia,
Anseio o repouso; não conhecer
O cansaço das mudanças, não ver
As incomensuráveis areias dos séculos
Beberem a embranquiçada tinta, nem ouvir o alto som
Da tumultuosa música das gerações."
(De Poemas, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Conduta
A pior indignidade que podemos cometer é a de querermos domar os desvarios do coração, estabelecer um ritmo civilizado para eles, tentar pacificá-los. Eles devem sacudir as frases, cortá-las, sangrá-las impiedosamente, encharcá-las de baba e desespero.
Há
Há no amor romântico certos arrebatamentos que, como febres da alma, nos atormentam até a loucura e aos quais, depois que nos consumiram até o último poro, nós, covardemente, para parecermos maduros, chamamos de tolices, como os outros os chamam.
sábado, 19 de dezembro de 2015
Três trechos de Malcolm Lowry
"E é assim que às vezes penso em mim mesmo, como num grande explorador que descobriu uma terra extraordinária da qual nunca mais ele consegue voltar para transmitir seu conhecimento ao mundo: e o nome dassa terra é inferno."
***
Acho que conheço bastante o sofrimento físico. Mas o pior de tudo é isso, sentir a própria alma morrendo. Talvez porque hoje à noite minha alma realmente morreu é que sinto neste momento alguma coisa parecida com a paz."
***
"Tenho deliberadamente lutado contra o meu amor por você. Não ousei sucumbir a ele. Agarrei-me a cada galho ou raiz que me servissem de apoio para atravessar sozinho esse abismo em minha vida, mas não posso mais continuar me enganando. Para sobreviver, preciso de sua ajuda. Senão, mais cedo ou mais tarde vou cair. Ah, se ao menos você tivesse me deixado na memoria uma razão qualquer para odiá-la, porque assim afinal um pensamento doce a seu respeito nunca me atingiria nesse lugar horrível!"
(De À sombra do vulcão, tradução de Leonardo Fróes, edição da L&PM.)
***
Acho que conheço bastante o sofrimento físico. Mas o pior de tudo é isso, sentir a própria alma morrendo. Talvez porque hoje à noite minha alma realmente morreu é que sinto neste momento alguma coisa parecida com a paz."
***
"Tenho deliberadamente lutado contra o meu amor por você. Não ousei sucumbir a ele. Agarrei-me a cada galho ou raiz que me servissem de apoio para atravessar sozinho esse abismo em minha vida, mas não posso mais continuar me enganando. Para sobreviver, preciso de sua ajuda. Senão, mais cedo ou mais tarde vou cair. Ah, se ao menos você tivesse me deixado na memoria uma razão qualquer para odiá-la, porque assim afinal um pensamento doce a seu respeito nunca me atingiria nesse lugar horrível!"
(De À sombra do vulcão, tradução de Leonardo Fróes, edição da L&PM.)
Priscylliana
Lila, Camila,
Fátima, Conceição,
enigmas do meu coração.
Lucila, Ludmila,
se vos chamásseis Priscylla
seríeis não uma rima,
seríeis uma solução.
Fátima, Conceição,
enigmas do meu coração.
Lucila, Ludmila,
se vos chamásseis Priscylla
seríeis não uma rima,
seríeis uma solução.
Abuso
Já chamaram Fernando Pessoa de Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis. Mas, francamente, chamá-lo de ortônimo...
Cidade maravilhosa
Enquanto eu decidia
se sou pacifista
ou belicista
uma bala perdida
foi encontrada
numa unidade pacificadora
simetricamente alojada
na testa de uma
renomada pesquisadora.
se sou pacifista
ou belicista
uma bala perdida
foi encontrada
numa unidade pacificadora
simetricamente alojada
na testa de uma
renomada pesquisadora.
Predestinação
Assim como, quando ouvimos um passarinho, sabemos que foi para cantar que ele nasceu, basta ouvirmos um verso, um só, de um poeta como Mario Quintana para sabermos que a ele não haveremos de pedir nada além da poesia.
Manoel, Mario, Wislawa
Manoel de Barros, Mario Quintana e Wislawa Szymborska são três desses poetas que, incluídos na categoria dos simples, dão a impressão de se limitarem a recolher a poesia. Não se jactam dela, não a reivindicam, e quase se desculpam por havê-la recolhido.
Omar Khayyam
"Lua sempre a brilhar, lua do meu prazer,
No céu raiou de novo, oh lua, o teu clarão!
Quantas vezes depois hás de procurar ver
Khayyam neste jardim, porém em vão! em vão!"
(De Rubaiyat, tradução de Jamil Almansur Haddad, edição da Biblioteca Universal Popular S.A.)
sexta-feira, 18 de dezembro de 2015
O ponto
O homem admitiu que a única coisa que lhe faltou na vida foi o amor. E - não sei se por um impulso de retórica ou de maldade - eu lhe disse que então lhe faltou tudo.
Marcadores:
Literatura
O que vale
Enquanto nos atormentamos para descobrir os motivos pelos quais escrevemos, deixamos passar despercebido o pássaro que bica nossa janela, pedindo abrigo contra o frio e as pedras.
Marcadores:
Literatura
Sinal
Os que morrerão pelo amor são facilmente reconhecíveis pelo seu sorriso resignado, no qual brilha sempre uma inexplicável alegria.
Marcadores:
Literatura
Questão de valor
O amor nos leva a passear pelo parque. Generoso, deixa que procuremos as ervas que tanto bem fazem ao nosso estômago. Permite que reguemos as outras e corramos em vão atrás dos passarinhos. Depois dessa meia hora diária, conduz-nos de volta para casa. Sabemos que, a partir do momento em que entramos, será inútil tentarmos recobrar sua atenção. O amor sabe quanto vale. E sabe quanto valemos nós: meia hora diária.
Marcadores:
Literatura
Um quarteto de Friedrich Hölderlin
"Os meus pêssegos amadurecem, surpreendem-me as flores,
O arbusto carregado de rosas é quase tão magnífico como as árvores.
A minha cerejeira entretanto encheu-se de frutos maduros;
E os próprios ramos põem-se ao alcance da mão para a colheita."
(Do livro Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
O arbusto carregado de rosas é quase tão magnífico como as árvores.
A minha cerejeira entretanto encheu-se de frutos maduros;
E os próprios ramos põem-se ao alcance da mão para a colheita."
(Do livro Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
quinta-feira, 17 de dezembro de 2015
Mario Quintana
Em Mario Quintana, mesmo o que não era poesia disfarçava muito bem.
Marcadores:
Literatura
Única
Minha bela, nunca te banhes duas vezes no mesmo rio, para que a nenhum deles ocorra a tentação de se presumir mar.
Marcadores:
Literatura
Honra
No peito
de onde aos borbotões
o sangue se esvaiu
ele hoje sente
pulsando triunfalmente
como condecorações
os ferimentos
que em mais do que pretérito tempo
o amor lhe infligiu.
de onde aos borbotões
o sangue se esvaiu
ele hoje sente
pulsando triunfalmente
como condecorações
os ferimentos
que em mais do que pretérito tempo
o amor lhe infligiu.
Marcadores:
Literatura
Um trecho de Arthur Schopenhauer
"Todo medíocre procura mascarar o estilo que lhe é próprio e natural. Isso o obriga, antes de tudo, a renunciar a toda ingenuidade, o que faz com que esta continue a ser o privilégio dos espíritos superiores, dotados de sentimento por si mesmos e que, portanto, agem com segurança."
(Do livro Sobre o ofício de escrever, tradução de Luiz Sérgio Repa e Eduardo Brandão, edição da Martins Fontes.)
(Do livro Sobre o ofício de escrever, tradução de Luiz Sérgio Repa e Eduardo Brandão, edição da Martins Fontes.)
Marcadores:
Literatura
quarta-feira, 16 de dezembro de 2015
Defesa
Termos buscado sempre a beleza é uma alegação vaga, mas como nos sentimos bem ao apresentá-la. Chegamos a acreditar nela e, se não parecesse estranho, nos aplaudiríamos com entusiasmo e agradeceríamos com um gesto reverente.
Marcadores:
Literatura
Pompa
A velhice veio. Não podendo trazer a sabedoria, trouxe a presunção, que se manifesta sempre depois de um pigarro cheio de solenidade, como se fosse a passagem mais grave de uma sinfonia.
Marcadores:
Literatura
No pátio
Um dia ainda ganho o nobel
ele diz enquanto napoleão
evocando as batalhas vencidas
e não recordando
se foram quarenta e duas
ou setenta e três
decide fechar a conta
em cento e noventa e três.
ele diz enquanto napoleão
evocando as batalhas vencidas
e não recordando
se foram quarenta e duas
ou setenta e três
decide fechar a conta
em cento e noventa e três.
Marcadores:
Literatura
Um trecho de Malcolm Lowri
"Olhou bem para as nuvens: escuros e velozes cavalos que se avolumavam no céu. Uma negra tempestade que rebentava fora da estação! Assim também era o amor, pensou; o amor que vinha tarde demais. Só que a ele não sucedia a bonança, como quando a fragrância do crepúsculo ou a tardia luz do sol e a umidade retornavam à terra surpreendida. M. Laruelle apressou ainda mais seus passos. Mesmo que um tal amor cegasse, emudecesse, enlouquecesse, matasse uma pessoa - seu destino não seria alterado pelo seu símile. Tonnerre de dieu... Dizer como era o amor que vinha tarde demais não saciava a sede."
(De À sombra do vulcão, tradução de Leonardo Fróes, edição da L&PM.)
(De À sombra do vulcão, tradução de Leonardo Fróes, edição da L&PM.)
Marcadores:
Literatura
terça-feira, 15 de dezembro de 2015
Happy end
Ir entrando no mar
ir avançando
até o ponto
em que voltar
seja uma palavra
que nem as ondas conheçam
nem nós queiramos pronunciar.
ir avançando
até o ponto
em que voltar
seja uma palavra
que nem as ondas conheçam
nem nós queiramos pronunciar.
Marcadores:
Literatura
15 de dezembro
Gostaria que hoje fosse 15 de dezembro de, vejamos, 2030. Pensando melhor, 15 de dezembro de 2035. A rude raça polonesa, tão ineficaz em tantas coisas, é conhecida por sua incômoda longevidade.
Marcadores:
Literatura
Cena
Talvez porque fosse verde, sobre o tapete pendurado no varal foi que pousou a borboleta, enquanto os girassóis, no canteiro, suspiravam sua decepção amarela.
Marcadores:
Literatura
Gigolô
Se você a lisonjeia
para pagar só meia
numa crestomatia
ou pelo privilégio
de figurar num florilégio
ou numa antologia
você não merece respirar
o ar que respira a poesia.
para pagar só meia
numa crestomatia
ou pelo privilégio
de figurar num florilégio
ou numa antologia
você não merece respirar
o ar que respira a poesia.
Marcadores:
Literatura
Uma estrofe de W.B. Yeats
"Oh, sábios que estais no sagrado fogo de Deus
Qual dourado mosaico sobre um muro,
Vinde desse fogo sagrado, roda que gira,
E sede os mestres do meu canto, da minha alma.
Devorai este meu coração; doente de desejo
E atado a um animal agonizante
Ele não sabe o que é; juntai-me
Ao artifício da eternidade."
(De Uma antologia, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Qual dourado mosaico sobre um muro,
Vinde desse fogo sagrado, roda que gira,
E sede os mestres do meu canto, da minha alma.
Devorai este meu coração; doente de desejo
E atado a um animal agonizante
Ele não sabe o que é; juntai-me
Ao artifício da eternidade."
(De Uma antologia, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
segunda-feira, 14 de dezembro de 2015
Soneto do sobrevivente do amor
Morreu hoje outro de nós.
Era de um grupo pioneiro,
O segundo, ou o primeiro,
O meu grupo veio após.
Nós somos poucos, agora,
E nossa crença no amor,
Nosso supremo senhor,
Arrefece de hora em hora.
Nós éramos jovens quando
Chegamos a este porão
Onde hoje estamos mofando.
Um de cada dois morreu
E até agora o amor não
Nos deu o que prometeu.
Era de um grupo pioneiro,
O segundo, ou o primeiro,
O meu grupo veio após.
Nós somos poucos, agora,
E nossa crença no amor,
Nosso supremo senhor,
Arrefece de hora em hora.
Nós éramos jovens quando
Chegamos a este porão
Onde hoje estamos mofando.
Um de cada dois morreu
E até agora o amor não
Nos deu o que prometeu.
Marcadores:
Literatura
Soneto da terna vassalagem
O amor também me encantou
E também eu quis cantá-lo.
Ele meu canto aceitou
E eu me tornei seu vassalo.
Como adorá-lo me honrou!
Como me fez bem louvá-lo!
Minha alma não se fartou
De amá-lo, de celebrá-lo.
Mas ele um dia, enfadado,
Livrou-me do amável jugo,
Dizendo-me adeus, é o fim.
Partido, despedaçado,
Me lembro ainda do verdugo,
Mas se lembra ele de mim?
E também eu quis cantá-lo.
Ele meu canto aceitou
E eu me tornei seu vassalo.
Como adorá-lo me honrou!
Como me fez bem louvá-lo!
Minha alma não se fartou
De amá-lo, de celebrá-lo.
Mas ele um dia, enfadado,
Livrou-me do amável jugo,
Dizendo-me adeus, é o fim.
Partido, despedaçado,
Me lembro ainda do verdugo,
Mas se lembra ele de mim?
Marcadores:
Literatura
Uma estrofe de S.T. Coleridge
"E eu fiz algo infernal, que traz
Desgraça e que horroriza;
Todos gritavam 'mataste a ave
Que fez bulir a brisa.
Ah, miserável! Matar a ave
Que fez bulir a brisa!'"
(De A balada do velho marinheiro, tradução de Alípio Correia de Franca Neto, publicação da Ateliê Editorial.)
Desgraça e que horroriza;
Todos gritavam 'mataste a ave
Que fez bulir a brisa.
Ah, miserável! Matar a ave
Que fez bulir a brisa!'"
(De A balada do velho marinheiro, tradução de Alípio Correia de Franca Neto, publicação da Ateliê Editorial.)
Marcadores:
Literatura
domingo, 13 de dezembro de 2015
Soneto da beleza inefável
Beleza pura, sem par,
Beleza etérea, intangível,
Esplêndida, imarcescível,
Como vos vou celebrar?
Pode alguém, ao escutar
Esta voz quase inaudível,
Imaginar ser possível
Ela vos representar?
Beleza única, essencial,
Sem semelhante ou igual
No vosso modo de ser,
Jamais falar de vós, creio,
Há de ser o melhor meio
Para vos enaltecer.
Beleza etérea, intangível,
Esplêndida, imarcescível,
Como vos vou celebrar?
Pode alguém, ao escutar
Esta voz quase inaudível,
Imaginar ser possível
Ela vos representar?
Beleza única, essencial,
Sem semelhante ou igual
No vosso modo de ser,
Jamais falar de vós, creio,
Há de ser o melhor meio
Para vos enaltecer.
A corda
Alguns momentos antes, ainda receava falhar. Suando frio, lembrou-se dos fracassos que sempre tivera com as gravatas. Não podia, como antigamente, pedir auxílio.
Da poesia
Gosto de relacionar a poesia antes ao acaso e à sorte que à persistência. A beleza é um dom, não uma conquista.
Mario Quintana
Quando eu era adolescente, depois de ler Drummond e Vinícius, sonhei ser um dia semelhante a eles. Pensava então que ninguém pudesse igualá-los. Não conhecia ainda Mario Quintana.
"No parque", de Georg Trakl
"Caminhando outra vez no velho parque,
Oh silêncio de flores amarelas e vermelhas!
Vocês também choram, bons deuses,
E o brilho outonal do olmeiro.
No lago azulado ergue-se imóvel
O junco, e à noite emudece o melro.
Oh! Então inclina tu também a fronte
Ante o mármore em ruínas dos ancestrais."
( Do livro De profundis, tradução de Claudia Cavalcanti, edição da Iluminuras.)
Oh silêncio de flores amarelas e vermelhas!
Vocês também choram, bons deuses,
E o brilho outonal do olmeiro.
No lago azulado ergue-se imóvel
O junco, e à noite emudece o melro.
Oh! Então inclina tu também a fronte
Ante o mármore em ruínas dos ancestrais."
( Do livro De profundis, tradução de Claudia Cavalcanti, edição da Iluminuras.)
sábado, 12 de dezembro de 2015
Artistas
Vivemos de aplausos.
Não venha quem
não vier para nos louvar.
Tocamos tambor
fazemos nossos filhos dançar.
Eles são estouvados
desajeitados
estropiados como nós.
Mas nós dançamos com eles
e juntamos à deles
nossa lastimável voz.
Passamos o chapéu depois
é verdade
mas é só formalidade.
Fiquem todos à vontade.
Nos damos por bem pagos
com um aplauso ou dois.
Não venha quem
não vier para nos louvar.
Tocamos tambor
fazemos nossos filhos dançar.
Eles são estouvados
desajeitados
estropiados como nós.
Mas nós dançamos com eles
e juntamos à deles
nossa lastimável voz.
Passamos o chapéu depois
é verdade
mas é só formalidade.
Fiquem todos à vontade.
Nos damos por bem pagos
com um aplauso ou dois.
Esperança
Talvez a morte não seja tão feia quanto dizem, assim como a vida não é tão bela quanto disseram.
Estranhezas matinais
Ao acordar de manhã, a viúva Seixas estranhou ver o segundo travesseiro em pé. Apalpando-o, achou-o mais quente que o dela. Olhou para o criado-mudo. Por um momento esperou ver ali o cinzeiro do marido, como se fosse possível. Fazia um mês que ele estava morto. Ela se levantou e, indo para o banho, irritou-se porque o chuveiro estava pingando. "Norberto, quando você vai aprender a fechar isso?", ela perguntou, mas era tão absurda a pergunta que ela riu. Depois do banho ela, descendo para a sala, olhou para o sofá como havia um mês não fazia. Na cozinha, ficou também olhando para tudo, como se ali houvesse alguma coisa a mais, ou a menos. Fez o café, tomou um gole, balançou a cabeça: "Você ia reclamar, Norberto. Coloquei pó demais, de novo." Esperou um pouco pela resposta, mas Norberto sempre havia sido generoso com suas pequenas falhas.
Um trecho de Arthur Schopenhauer
"Quem escreve de maneira afetada assemelha-se a quem se enche de enfeites para não ser confundido e misturado com a plebe; um perigo que o gentleman não corre, mesmo nos piores trajes."
(Do livro Sobre o ofício do escritor, tradução de Luiz Sérgio Repa e Eduardo Brandão, edição da Martins Fontes.)
(Do livro Sobre o ofício do escritor, tradução de Luiz Sérgio Repa e Eduardo Brandão, edição da Martins Fontes.)
sexta-feira, 11 de dezembro de 2015
Da delicadeza do amor
O amor há de ser sempre delicado. Que nós, até no dia derradeiro, possamos exibir no rosto morto algo que se assemelhe ao menos um pouco a um sorriso. Que as marcas de sofrimento, se houver, fiquem por conta da alma e de sua discrição.
Marcadores:
Literatura
No jardim
Ela disse o nome do amado no jardim e por um instante as sílabas, flutuando, misturaram-se às pétalas, amorosas palavras da confissão que o vento ia extraindo das tímidas margaridas.
Marcadores:
Literatura
Mario Quintana
Diante de tudo que observava, Mario Quintana tinha sempre uma atitude: se aquilo não era ainda, ele encontrava um jeito de transformá-lo em poesia.
Marcadores:
Literatura
Plantio
Enterraram-nos
a nós e aos
nossos instintos daninhos.
Que esperam que nasça?
Flores ou só espinhos?
a nós e aos
nossos instintos daninhos.
Que esperam que nasça?
Flores ou só espinhos?
Marcadores:
Literatura
Cotação do dia
Talvez os dedos da Morte não sejam tão frios quanto os de tantas amadas.
Marcadores:
Literatura
Quatro versos de Friedrich Hölderlin
"Mas para que este tempo em declínio não nos escape,
Como aos que se julgam sábios, já vou ao teu encontro,
Até aos limites dos campos, onde as águas azuis
Circundam a minha amada terra natal e a ilha do rio."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Como aos que se julgam sábios, já vou ao teu encontro,
Até aos limites dos campos, onde as águas azuis
Circundam a minha amada terra natal e a ilha do rio."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
quinta-feira, 10 de dezembro de 2015
Mario Quintana
Jamais ocorreu a Mario Quintana lastimar-se por ter, na principal resolução de sua vida, tomado a decisão prontamente, sem querer sequer saber se havia outra opção além da poesia.
Marcadores:
Literatura
Diálogo
Conversar com flores e estrelas não é proeza para um poeta maduro. É algo que ele, se não fez quando menino, talvez possa pairar como uma dúvida sobre a autenticidade de sua vocação.
Marcadores:
Literatura
Via láctea
Fechar os olhos para o céu noturno e soprar para o alto teu nome. Depois, ir reabrindo-os aos poucos e ter o amoroso discernimento de ver, entre todas as estrelas, aquela na qual, por seu brilho único, sentirei a palpitação leitosa de tuas vogais e de tuas consoantes.
Marcadores:
Literatura
Seis versos de W.B. Yeats
"E declaro a minha fé:
Rio-me do pensamento de Plotino
E grito na cara de Platão,
A morte e a vida não existiam
Até o homem tudo inventar,
Tudo conceber."
(De Uma antologia, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Rio-me do pensamento de Plotino
E grito na cara de Platão,
A morte e a vida não existiam
Até o homem tudo inventar,
Tudo conceber."
(De Uma antologia, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
quarta-feira, 9 de dezembro de 2015
Cotação do dia
Se o amor merece ir à puta que o pariu, não usemos eufemismos.
Marcadores:
Literatura
Guia-SP
Enquanto na vila mariana
domingos de morais dorme
no brás rangel pestana.
domingos de morais dorme
no brás rangel pestana.
Marcadores:
Literatura
Haicai (para o Xico Sá)
A velhice é feia.
Louvor só faço se for
À velhice alheia.
Louvor só faço se for
À velhice alheia.
Marcadores:
Literatura
O amor em seu tempo final
Chegou o tempo.
Despido de todo o som
e de toda a fúria
o amor é como
um velhote
caminhando por um parque.
Dói-lhe tudo no corpo:
as feridas
as chagas
as cicatrizes
e ele a cada passo
ergue os braços
e profere maldições.
Mas visto de longe
ele dá a impressão
de ser um cidadão
de cabelos brancos
dizendo palavras amáveis
aos passarinhos do parque.
Despido de todo o som
e de toda a fúria
o amor é como
um velhote
caminhando por um parque.
Dói-lhe tudo no corpo:
as feridas
as chagas
as cicatrizes
e ele a cada passo
ergue os braços
e profere maldições.
Mas visto de longe
ele dá a impressão
de ser um cidadão
de cabelos brancos
dizendo palavras amáveis
aos passarinhos do parque.
Marcadores:
Literatura
Um trecho de Dietrich Schwanitz
"É evidente que não existe um modelo real para Laura, contrariamente à Beatriz de Dante; por outro lado, ela é representada de forma mais real do que as figuras angelicais dos trovadores ou de Dante. Os poemas dirigidos a Laura estabelecem o conflito que se apresentará em poetas líricos posteriores: o amado quer ser ouvido, mas sabe que, se o for, sua poesia sofrerá."
(Do livro Cultura geral, tradução de Beatriz Silke Rose, Eurides Avance de Souza e Inês Antonia Lobhauer, publicação da Martins Fontes.)
(Do livro Cultura geral, tradução de Beatriz Silke Rose, Eurides Avance de Souza e Inês Antonia Lobhauer, publicação da Martins Fontes.)
Marcadores:
Literatura
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
Cotação do dia
Espero que leias diariamente o que escrevo sobre ti. Se sorrires daquele jeito, como costumavas fazer, absolverei teu desdém.
Marcadores:
Literatura
Confissão
"Por que você sofre assim? Não quer me contar?", ela perguntou, segurando-me as mãos. Se ela as pusesse sobre o meu coração, ele confessaria tudo, a cada um dos seus dedos.
Marcadores:
Literatura
Síndrome (para Rosa Matos)
Nunca sei, ao despertar,
Se estou aqui ou ali,
Se estou vivo ou sou zumbi.
Se alguém souber, é o Cotard.
Se estou aqui ou ali,
Se estou vivo ou sou zumbi.
Se alguém souber, é o Cotard.
Marcadores:
Literatura
Amor (para Liberato Vieira da Cunha)
Sentiu uma dor tão grande, tão aguda, que era como se um violino estivesse agonizando em seu peito.
Marcadores:
Literatura
Contrassenso
Que eu não esteja com a cabeça muito boa é algo que talvez se entenda facilmente em alguém que se presume poeta. Mas que também o tronco e os membros se revelem fracos e quebradiços é já castigo demais.
Marcadores:
Literatura
Metamorfose
Por uma semana os bem-te-vis da rua triste de periferia cantaram seu canto mais especial. Como resultado desse proselitismo, hoje os homens, os meninos e até as mulheres entremeiam palavras com assobios, quando param para conversar.
Marcadores:
Literatura
Ela
Tão mais formosa ela está hoje que a brisa e a quaresmeira do parque, em breve conluio, resolvem atirar-lhe uma flor, como se ela fosse uma rainha e a bicicleta fosse sua carruagem.
Marcadores:
Literatura
Soneto da subalternidade (para Jorge Cláudio Ribeiro e Silvia Galant François)
Estamos sempre por perto.
Nós somos aquele que
Nunca (todo mundo vê)
Caminha com o passo certo.
Quem quer nossa companhia?
Ninguém deseja nos ver.
Nada sabemos fazer,
Qual é nossa serventia?
Nós sempre por perto estamos,
Mas sem atuar, sem agir.
Nós somente acompanhamos
E só sabemos errar:
Chorar se nos mandam rir,
Rir se nos mandam chorar.
Nós somos aquele que
Nunca (todo mundo vê)
Caminha com o passo certo.
Quem quer nossa companhia?
Ninguém deseja nos ver.
Nada sabemos fazer,
Qual é nossa serventia?
Nós sempre por perto estamos,
Mas sem atuar, sem agir.
Nós somente acompanhamos
E só sabemos errar:
Chorar se nos mandam rir,
Rir se nos mandam chorar.
Marcadores:
Literatura
Um poema de Ren Yu (século XIII)
"As montanhas e os rios. Tanto a beleza
Preenche assim os anos
E tropas vêm do Este
E as de Oeste, borrachas.
Pescadores, os da floresta. Falam: - O que desce e sobe.
Sou um homem lhano dos Plainos do Centro e para
O Palácio do Unicórnio certamente não vai meu retrato."
(De Uma antologia de poesia chinesa, tradução de Gil de Carvalho, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Preenche assim os anos
E tropas vêm do Este
E as de Oeste, borrachas.
Pescadores, os da floresta. Falam: - O que desce e sobe.
Sou um homem lhano dos Plainos do Centro e para
O Palácio do Unicórnio certamente não vai meu retrato."
(De Uma antologia de poesia chinesa, tradução de Gil de Carvalho, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Marcadores:
Literatura
segunda-feira, 7 de dezembro de 2015
Soneto da mudez da morte
E de repente você,
Sem nem saber a razão,
Vale tanto quanto se
Fosse um morto no caixão.
Você se move, ergue a mão,
Pergunta a todos: por quê?
Mas alguém responde? Não.
Todos emudecem, e
Devagar vão se afastando,
E não se importam nem quando
Você, sozinho na sala,
Se desespera, se agita,
E chama todos, e grita.
Um homem morto não fala.
Sem nem saber a razão,
Vale tanto quanto se
Fosse um morto no caixão.
Você se move, ergue a mão,
Pergunta a todos: por quê?
Mas alguém responde? Não.
Todos emudecem, e
Devagar vão se afastando,
E não se importam nem quando
Você, sozinho na sala,
Se desespera, se agita,
E chama todos, e grita.
Um homem morto não fala.
Marcadores:
Literatura
Norma
Devemos evitar escrever sempre o trivial. Mas, principalmente, devemos eximir-nos de perseguir em cada frase o extraordinário.
Marcadores:
Literatura
Cotação do dia
Estar morto é uma percepção que até os vivos menos sensíveis costumam ter.
Marcadores:
Literatura
Ardil
Mesmo sem caneta, sair sempre com o bloquinho. Talvez sobre ele caia uma lágrima de bem-te-vi.
Marcadores:
Literatura
"Herança", de Mariana Ianelli
"Não escolhemos voltar, ter as mãos
E os pés desatados, feito Lázaro,
O milagre do riso no fundo de um espelho
Onde se foram misturar pavor e náusea.
Outra vez e a cada passo às cegas,
Os filodendros até a porta de entrada,
Voltamos e a nossa maior fortuna
É um rescaldo de violentas tempestades."
(Do livro O amor e depois, publicação da Iluminuras.)
E os pés desatados, feito Lázaro,
O milagre do riso no fundo de um espelho
Onde se foram misturar pavor e náusea.
Outra vez e a cada passo às cegas,
Os filodendros até a porta de entrada,
Voltamos e a nossa maior fortuna
É um rescaldo de violentas tempestades."
(Do livro O amor e depois, publicação da Iluminuras.)
Marcadores:
Literatura
domingo, 6 de dezembro de 2015
A voz do dono
Amo essa mulher. Como não amaria? Ela me deu três filhas, todas maravilhosas como a mãe. Que sorte vão ter os maridos delas.
Teclas
Tenho falado tanto de minha pequenez, de minha inaptidão e de minha ojeriza à vida que alguém pode pensar que me orgulho delas.
Soneto do que não deve nos inspirar
Nada que não seja dor,
Nada que não sofrimento,
Que não aflição, tormento,
Que não derrota e rancor.
Nada que não nos maltrate,
Nada que não nos trespasse,
Não nos mutile, espedace,
Não nos aleije nem mate.
Nada que em nós poderia
Ser visto como ilusão
Ou então como a alegria
Estúpida de viver,
Jamais qualquer atenção
De nós há de merecer.
Nada que não sofrimento,
Que não aflição, tormento,
Que não derrota e rancor.
Nada que não nos maltrate,
Nada que não nos trespasse,
Não nos mutile, espedace,
Não nos aleije nem mate.
Nada que em nós poderia
Ser visto como ilusão
Ou então como a alegria
Estúpida de viver,
Jamais qualquer atenção
De nós há de merecer.
Se
Se tens aí em tua rua - quem sabe em teu quintal - uma dessas árvores grandes e saudáveis, pergunta-lhe se aceitaria estender um galho amável para o meu pescoço.
Cotação do dia
Velho demais até para lançar maldições. As palavras se embaralham na saliva e o rancor fica na alma.
www.rubem.wordpress.com
Hoje, na revista Rubem, falo daquilo para que fui feito: coisas, coisinhas, nada além.
Um trecho de Liberato Vieira da Cunha
"Me pegou sem aviso o desejo de disparar-lhe uma carta romântica e suspirosa e desesperançada, toda traçada em excelente caligrafia, numa folha pautada, como quem escreve para uma perdida deusa, repentinamente evadida do passado mais que perfeito."
(Da crônica "Folhas pautadas", extraída do livro O silêncio do mundo, publicação da AGE Editora.)
(Da crônica "Folhas pautadas", extraída do livro O silêncio do mundo, publicação da AGE Editora.)
sábado, 5 de dezembro de 2015
Dindim dim dim dim dom
João Gilberto é aquele cantor que, segundo alguns críticos, perdeu a voz logo no início da carreira.
Per aspera ad astram
Minha próxima tentativa de tornar-me famoso será compor um rap para aniversariantes: o rapbirthdayforyou.
Assim e assim
Por capricho da zombeteira raça dos antônimos, a mulher de nossa vida pode ser a mulher de nossa morte.
Um comentário de Dietrich Schwanitz
"O autor da epopeia grega foi Homero. O autor da Bíblia foi Deus. Ambos são conhecidos como escritores mitológicos: Homero não podia ver; Deus não podia ser visto - era proibido fazer um retrato dele."
(Do livro Cultura geral - Tudo o que se deve saber, tradução de Beatriz Silke Rose, Eurides Avance de Souza e Inês Antonia Lohbauer, edição da WMF Martins Fontes.)
(Do livro Cultura geral - Tudo o que se deve saber, tradução de Beatriz Silke Rose, Eurides Avance de Souza e Inês Antonia Lohbauer, edição da WMF Martins Fontes.)
sexta-feira, 4 de dezembro de 2015
No muro
Quem tem a direita
e para alguma eventualidade
também a canhota
só passa necessidade
se for idiota.
e para alguma eventualidade
também a canhota
só passa necessidade
se for idiota.
Marcadores:
Literatura
Soneto de quem sofreu as misérias do amor
Ele mesmo é quem me diz:
Foi o rei das marafonas.
Teve uma infância infeliz,
Sem primas, aias ou donas.
Cada um escolhe seu deus.
Uns se submetem a Pã,
Outros se curvam a Zeus.
Menino, ele quis Onã.
Depois, por sua fealdade,
Desfrutou amor somente
Por dinheiro ou caridade.
Isso é o que ele conta a mim,
Pausada, tranquilamente,
Desde o início até o fim.
Foi o rei das marafonas.
Teve uma infância infeliz,
Sem primas, aias ou donas.
Cada um escolhe seu deus.
Uns se submetem a Pã,
Outros se curvam a Zeus.
Menino, ele quis Onã.
Depois, por sua fealdade,
Desfrutou amor somente
Por dinheiro ou caridade.
Isso é o que ele conta a mim,
Pausada, tranquilamente,
Desde o início até o fim.
Marcadores:
Literatura
Soneto do júbilo que o amor nos traz (p/ Priscylla Mariuszka Moskevitch)
A um homem que ao amor se submeteu
E vê no inferno as bênçãos do paraíso,
Não perguntem jamais por seu juízo
Pois já há muito tempo ele o perdeu.
Sabe muito bem disso quem, como eu,
Desprezando qualquer cautela e aviso,
Logo ao primeiro olhar, vago, indeciso,
O amor como senhor reconheceu.
Todos me dizem que ele é meu algoz,
Mas como pode ser, se sua voz
Acende em mim a chama da ternura,
Se são doces as suas chibatadas
E se estas minhas costas flageladas
Regozijam-se com sua tortura?
E vê no inferno as bênçãos do paraíso,
Não perguntem jamais por seu juízo
Pois já há muito tempo ele o perdeu.
Sabe muito bem disso quem, como eu,
Desprezando qualquer cautela e aviso,
Logo ao primeiro olhar, vago, indeciso,
O amor como senhor reconheceu.
Todos me dizem que ele é meu algoz,
Mas como pode ser, se sua voz
Acende em mim a chama da ternura,
Se são doces as suas chibatadas
E se estas minhas costas flageladas
Regozijam-se com sua tortura?
Marcadores:
Literatura
Resumo
O que aconteceu foi simples: não soubemos lidar com o amor. Disseram-nos que ele não era venenoso nem mordia.
Marcadores:
Literatura
Um pensamento de Cioran
"Somos todos impostores que nos suportamos uns aos outros. Quem não aceitasse mentir sentiria a terra fugir sob seus pés: estamos biologicamente obrigados ao falso."
Marcadores:
Literatura
quinta-feira, 3 de dezembro de 2015
Cotação do dia
Houve um tempo - curtíssimo - no qual, para saber o que era amor, eu não precisava consultar a memória nem o dicionário.
Marcadores:
Literatura
Bésame mucho
Dançavam. Descalça, ela subiu nos sapatos dele e, bebida por beijos que o bolero ia tornando a cada instante mais cálidos, deixou-se conduzir para o quarto com um vagar que ao mesmo tempo adiava e antecipava o mútuo prazer.
Marcadores:
Literatura
Projeto
Gostaria de ser um cavalo, jovem o bastante para galopar alegremente, relinchar poeticamente e ir deixando no caminho preciosas pepitas verdes.
Marcadores:
Literatura
Espelho
Não sei de nada. Sei de mim. Certamente não tudo, mas o suficiente para ter, de mim, a pior das opiniões.
Marcadores:
Literatura
Mario Quintana
Diante de um sabiá, Mario Quintana não cantava, para não constrangê-lo.
Marcadores:
Literatura
Frida na oferta
O livro de J.M.G. Le Clézio sobre Frida Kahlo é enfadonho como um texto da Wikipedia e oportunista como um manualzinho de autoajuda. Deprimente, para um Nobel.
Marcadores:
Literatura
Guia-SP
Barbeiro arrojado
tem uma barbearia
na nestor pestana
e outra na heitor penteado.
tem uma barbearia
na nestor pestana
e outra na heitor penteado.
Marcadores:
Literatura
Reconstrução
Um homem há de saber
se recriar
se reconstruir
se erguer
sobre as cinzas
da própria vida
para estar
se não altaneiro
ao menos inteiro
tanto quanto
se pode ser
tanto quanto
se pode ficar
na sua hora de morrer.
se recriar
se reconstruir
se erguer
sobre as cinzas
da própria vida
para estar
se não altaneiro
ao menos inteiro
tanto quanto
se pode ser
tanto quanto
se pode ficar
na sua hora de morrer.
Marcadores:
Literatura
Um trecho de Liberato Vieira da Cunha
"Mas o que quero dos livros é algo diverso e único. É essa essência fugidia e rara a que chamam beleza."
(Da crônica "O livro roubado", extraída do livro O silêncio do mundo, publicado pela AGE Editora.)
(Da crônica "O livro roubado", extraída do livro O silêncio do mundo, publicado pela AGE Editora.)
Marcadores:
Literatura
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015
Guia-SP
A chuva começa aqui
no paraná
prossegue no pi
e só acaba ali
na barão de
paranapiacaba.
no paraná
prossegue no pi
e só acaba ali
na barão de
paranapiacaba.
Marcadores:
Literatura
Maneiras
A um passarinho novo, se queres fazê-lo cantar, basta que lhe dês alpiste. A um pássaro velho, melhor será se lhe disseres palavras amáveis.
Marcadores:
Literatura
A flor
Porque a mereces, te mandarei todas as manhãs esta flor espinhenta e rancorosa. Tu ajudaste a cultivá-la, com teu desdém cerimonioso e sempre presente. Não a rejeites agora.
Marcadores:
Literatura
Ao que tudo indica
A partir de hoje serei um homem morto, para o que há de mais importante na vida. A única coisa que poderia me salvar não me salvará.
Marcadores:
Literatura
Tresvariar
Às vezes o amor precisa se descabelar e gritar do alto da torre, como uma monja louca, para se fazer entender.
Marcadores:
Literatura
Soneto do tempo da bem-aventurança
Hoje podes viver serenamente.
O amor se foi e, quando o amor se vai,
Tudo o que nós pensamos ser se esvai
E murcha e morre inapelavelmente.
O que foi, foi outrora, antigamente,
Num tempo que a memória agora trai,
Num ontem em que havia flores, ai!,
Que jamais conheceram o presente.
Daquilo nada mais te diz respeito,
Outro hoje é o coração que tens no peito,
E aquelas horas não são mais esta hora.
Estás vazio enfim, nada te prende,
Em ti nada mais pede nem pretende.
Tu já podes morrer em paz agora.
O amor se foi e, quando o amor se vai,
Tudo o que nós pensamos ser se esvai
E murcha e morre inapelavelmente.
O que foi, foi outrora, antigamente,
Num tempo que a memória agora trai,
Num ontem em que havia flores, ai!,
Que jamais conheceram o presente.
Daquilo nada mais te diz respeito,
Outro hoje é o coração que tens no peito,
E aquelas horas não são mais esta hora.
Estás vazio enfim, nada te prende,
Em ti nada mais pede nem pretende.
Tu já podes morrer em paz agora.
Marcadores:
Literatura
Sursum corda
Levantem os corações.
Que eles nas estrelas toquem
E que mudanças provoquem
No roteiro dos aviões.
Que eles nas estrelas toquem
E que mudanças provoquem
No roteiro dos aviões.
Marcadores:
Literatura
Terceirização
Dizer que o inferno são os outros é a mais perfeita modalidade de terceirização que conheço. Contam que foi Sartre quem a criou. Acredito mais num advogado.
Marcadores:
Literatura
Palavras ao vento
Faço este blog para quem?
Há seis anos já, a fio,
Critico, poeto, elogio,
Não me responde ninguém.
Há seis anos já, a fio,
Critico, poeto, elogio,
Não me responde ninguém.
Marcadores:
Literatura
Visão
Para um homem movido pela insanidade amorosa, parece que os moinhos de vento são gigantes que esparramam flores pelo ar.
Marcadores:
Literatura
De J.M.G. Le Clézio sobre Frida Kahlo
"É em grande parte a Frida que Diego deve o amor carnal que sente pelo mundo que o cerca. Alguma coisa da dor intensa de sua mulher penetrou nele, transformou-o, uniu-o àquela experiência sobre-humana . O 'monstruoso bebê' de que falava Élie Faure aos amigos parisienses tornou-se o verdadeiro filho de Frida, que, seguidamente, ela põe no mundo e que prolonga sua própria existência."
(De Diego e Frida, tradução de Vera Lúcia dos Reis, publicação da Editora Record.)
(De Diego e Frida, tradução de Vera Lúcia dos Reis, publicação da Editora Record.)
Marcadores:
Literatura
terça-feira, 1 de dezembro de 2015
Boa noite
Dizer boa noite com toda a honestidade que, se não se revelou hoje, jamais se revelará.
Marcadores:
Literatura
Ao que tudo indica
A partir de amanhã serei um homem morto, para o que há de mais importante na vida.
Marcadores:
Literatura
O jeito
Às vezes o amor precisa se descabelar e gritar do alto da torre, como uma monja louca, para se fazer entender.
Marcadores:
Literatura
Amanhã
Amanhã será um desses dias em que melhor seria estar morto. Outrora, 2 de dezembro foi importante para mim. Só para mim.
Marcadores:
Literatura
Alternativa
Se ela ao menos tivesse me viciado no seu fumo, já que não consegui viciá-la no meu amor.
Marcadores:
Literatura
Pergunta (2)
O que diremos a quem nos matou? Que foi uma bênção termos tido tão gentil carrasco? E quem acreditará na voz de um defunto?
Marcadores:
Literatura
Pergunta
Quem mente para os filhos, por que irá dizer a verdade aos outros, a não ser que sejam aqueles indispensáveis amiguinhos de cama?
Marcadores:
Literatura
Cotação de amanhã
Com que cara aparecerei amanhã aqui? Quantos ainda me acreditarão honesto? E quantos rirão de meu rosto velho, que ainda não aprendeu a ter compostura?
Marcadores:
Literatura
Pris
Se conseguíssemos puxar o coração pela garganta e colocá-lo em cima da mesa, ou da cama, diriam ou ai que nojo ou perguntariam: todo teu amor é só esse?
Marcadores:
Literatura
Pris
Quem há de se incomodar com o amor e suas sequelas, se tudo fica sempre bem melhor no horário das novelas?
Marcadores:
Literatura
Pris
Vai chegando a meia-noite e me sinto como alguém que, participando de um reality show, exibiu, para ser o vencedor, as chagas do amor no peito. Em minhas mãos tenho ainda a deslealdade e a mentira do mercurocromo.
Marcadores:
Literatura
Pris
Imagino que não terei nada mais a dizer amanhã. Seria injusto para a minha alma, depois que a escancarei hoje como o bolso de um homem acusado de furto, numa praça.
Marcadores:
Literatura
Pris
E um dia se descobre que a poesia era só uma visão juvenil sobre algo que se pensou ser amor, e a morte já seria não um alívio, mas uma decisão tardia e sem sentido, como um quarto ato.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch gostaria de ter tudo que de maravilhoso sempre apontei nela, desde que fosse outro quem o dissesse.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch não estimularia ninguém a saltar de um viaduto. Mas sei que nunca tentaria me dissuadir.
Marcadores:
Literatura
Pris
Não vou negar: Priscylla Mariuszka Moskevitch às vezes tinha lances de adorável titia. Certa ocasião ela me convidou a acompanhá-la em uma viagem a Mumbai. Depois que consultei o despachante e convenci minha espantada família, ela, levada certamente por seus bons princípios, retirou o convite.
Marcadores:
Literatura
Pris
A causa de minha desgraça foi Priscylla Mariuszka Moskevitch querer ser uma pessoa legal e mentir, se preciso, para manter essa fama. Por que ela não me disse logo que eu era velho demais, tolo demais, pouco homem demais, para ela?
Marcadores:
Literatura
Pris
O problema de Priscylla Mariuszka Moskevitch foi o de achar encantadora, desde cedo, a ideia de não ser aristocrata. Se não houvesse se rebelado contra a própria situação, não conheceria tantos tipos insignificantes que, iguais a mim, conheceu. Teria dito, logo ao primeiro sanfoneiro ou abigeatário: "Ora, vai procurar tua turma!"
Marcadores:
Literatura
Pris
Nas vezes em que acorda, de madrugada, Priscylla Mariuszka Moskevitch não vai fazer pipi, como as donas de casa. Procura retomar o sonho no ponto em que dava, num copo cheio, sal a um homem sedento chamado por acaso Raul.
Marcadores:
Literatura
Sarjeta
Quando começamos a lançar cusparadas às estrelas que por tanto tempo cultivamos com o mais precioso leite de nossa alma, não estamos entrando no caminho da abjeção. Já o atingimos.
Marcadores:
Literatura
Pris
Depois de tantas insanas confissões, amanhã estarei mais doente que agora. E me sentirei ridículo. Mas que hoje a alma seja revelada, como um câncer no reto.
Marcadores:
Literatura
Pris
Talvez num dia bem distante eu consiga pronunciar o nome de Priscylla Mariuszka Moskevitch sem que minha boca espume como a de um cachorro louco.
Marcadores:
Literatura
Pris
Há um momento em que se deve dizer: maldita, perniciosa, desgraçada - mesmo que estejamos nos dirigindo a alguém tão aparentemente doce como Priscylla Mariuszka Moskevitch.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch conseguiu acordar o que hoje tenho de pior: o sentimento de inferioridade, o ódio e o desejo de desforra.
Marcadores:
Literatura
Pris
A oportunidade de conhecer Priscylla Mariuszka Moskevitch, vista pelos meus olhos de hoje, foi para mim como ingressar ao mesmo tempo num curso de formação de poetas, num de aprimoramento de dementes e num de preparação de suicidas. Não me tornei poeta, mas vejo boas perspectivas nos outros dois cursos.
Marcadores:
Literatura
Pris
Que diabo pode ter levado Priscylla Mariuszka Moskevitch a dedicar cinco anos de sua vida à tarefa de enlouquecer um homem tão inexpressivo quanto eu? Frida enlouqueceu Diego, Zelda enlouqueceu Scott.
Marcadores:
Literatura
Doce Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch é o tipo de pessoa capaz de, encontrando uma pulga na blusa, imediatamente sair acusando um cachorro.
Marcadores:
Literatura
Prislovska
Para minha saúde, teria sido uma bênção descobrir, cinco anos atrás, que Priscylla Mariuszka Moskevitch ronca como um general russo encharcado de vodca.
Marcadores:
Literatura
Pris
Falei tanto de Priscylla Mariuszka Moskevitch, de sua satânica crueldade, e no entanto minha alma está ainda completamente envenenada.
Marcadores:
Literatura
Pris
Tudo que Priscylla Mariuszka Moskevitch pode dizer de mim é que sou louco. Ela sabe por quê.
Marcadores:
Literatura
Pris
Triste é o dia em que tu tens de dizer, para ti e para o mundo, que Priscylla Mariuszka Moskevitch é o nome da mais amaldiçoada, falsa e cruel das criaturas, e que és um idiota por não haveres percebido isso desde a primeira vez.
Marcadores:
Literatura
Pris
Faltou-me, a mim e à minha saúde mental, ver não a Priscylla Mariuszka Moskevitch que idealizei com a minha tola poesia, mas aquela que toda manhã acorda depois de babar no travesseiro.
Marcadores:
Literatura
Pris
Se sabes quem é Priscylla Mariuszka Moskevitch, se a conheces, afasta-te já, ou vai com ela ao inferno.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch viu, em mim, alguém sensível o bastante, e idiota o suficiente, para ser a vítima das vinganças que ela acumulou por ser repudiada por tantos homens, alguns ainda mais desprezíveis do que eu.
Marcadores:
Literatura
Nomes
Existem demônios capazes de destruir uma alma. Têm geralmente nomes graciosos, de mulher.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch ama os cães. Um homem, para agradar-lhe, há de saber latir verossimilmente, além de desincumbir-se da agradável tarefa de lhe lamber os pés sem tirar o esmalte dos dedos.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch teria mais afeição por mim se eu fosse uma cobra, e ela presidisse uma associação de defesa de ofídios.
Marcadores:
Literatura
Pris
Quem não sabe como é o sangue dos lírios, é porque nunca olhou para as mãos de Priscylla Mariuszka Moskevitch.
Marcadores:
Literatura
Pris
Para que Priscylla Mariuszka Moskevitch seja a gata dileta da bruxa, falta só o bigode.
Marcadores:
Literatura
Pris
Em todas as suas mensagens, até nas amorosas, Priscylla Mariuszka Moskevitch revelava a índole daquelas rainhas antigas cujos caprichos consistiam em mordiscar flores ou em mandar executar soldados imberbes.
Marcadores:
Literatura
Pris
Em Priscylla Mariuszka Moskevitch sempre houve algo de demoníaco, que eu jamais quis admitir.
Marcadores:
Literatura
Cotação do dia
Morrer é uma dessas hipóteses em que se deve pensar - porém não muito habitualmente, para não se transformar em obrigação.
Marcadores:
Literatura
Pris
Priscylla Mariuszka Moskevitch não foi uma brincadeira do destino; foi uma imposição.
Marcadores:
Literatura
Soneto dos que devem ser incinerados
Lançar no incinerador
Sem demora toda a malta:
Tanto quem morreu de amor
Quanto quem de sua falta.
Deixar o tempo escorrer,
Deixar o fogo queimar
Quem morreu por amor ter,
Quem por amor lhe faltar.
Incinerar esses tolos
E depois numa urna pô-los,
Para servirem de exemplo
A todos que ainda não sabem
Que já mortos nenhuns cabem
Onde o amor mantém seu templo.
Sem demora toda a malta:
Tanto quem morreu de amor
Quanto quem de sua falta.
Deixar o tempo escorrer,
Deixar o fogo queimar
Quem morreu por amor ter,
Quem por amor lhe faltar.
Incinerar esses tolos
E depois numa urna pô-los,
Para servirem de exemplo
A todos que ainda não sabem
Que já mortos nenhuns cabem
Onde o amor mantém seu templo.
Marcadores:
Literatura
Bizarria
Hoje, quando falo de amor, sinto-me como um sapo tentando lisonjear a lua.
Marcadores:
Literatura
Simpatiquinho
Serás o velhinho do 203, do 304 ou do 405, que gostava de conversar com as enfermeiras e que, coitado, morreu como todas elas imaginavam desde o primeiro dia em que, internado, piscaste para elas e pediste que não se preocupassem, porque o teu era só um probleminha de coração.
Marcadores:
Literatura
Ocaso
Cansada como eu, minha poesia não tem mais a presunção de exprimir as árvores. Já nem consegue erguer os olhos para elas. Limita-se a recolher as folhas caídas e a simular, no seu mortiço amarelo, o esplendor do ouro.
Marcadores:
Literatura
De J.M.G. Le Clézio sobre Frida Kahlo
"Enquanto Diego vive sua vida sensual, enquanto devora todos e todas que se aproximam dele, e continua incansavelmente a cobrir as paredes com sinais e símbolos de uma história que o ultrapassa, Frida sabe que longe de seu sol ela só pode esfriar e descer ao inferno do nada. Ela tenta sobreviver, fugir com Anita Brenner, faz um mad cap flight de avião particular até Nova York, experimenta o flerte insistente com outros homens, deixa que acreditem numa história de experiência lésbica."
(De Diego e Frida, tradução de Vera Lúcia dos Reis, publicação da Editora Record.)
(De Diego e Frida, tradução de Vera Lúcia dos Reis, publicação da Editora Record.)
Marcadores:
Literatura
Assinar:
Postagens (Atom)