sexta-feira, 3 de junho de 2016
00h23
Cochilei de novo debruçado sobre a mesa e só agora vou fechar a loja. Foi mais um dia sem visitante nenhum. À tarde passou por aqui um fiscal da prefeitura que olhou para os livros, os discos, as fotos, as folhas com versos rabiscados (essa dispersão que poderia ser uma metáfora do caos) e me perguntou o que eu pretendia com isso tudo. Eu lhe disse que, apesar do desalinho, a loja é na verdade uma exposição e que eu a venho mantendo na esperança de um dia ver entrar nela alguém, aquele ser único que a inspirou e tem relação com todos esses objetos. Ele entendeu que eu aguardava uma mulher tola o suficiente para adquirir a disparatada coleção. Quando eu informei que nenhum dos objetos está à venda, ele balançou a cabeça: "Que estranho, isso. O senhor é poeta?" Respondi que não, sentindo toda a tristeza por ter lidado tanto e tão intensamente com o amor sem haver aprendido a exprimi-lo em versos ao menos aceitáveis. Todas as outras reminiscências imagino também que nada valham e provocariam risos naquela pessoa única e especial, se um dia ela entrasse aqui.
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