"Não escrevas versos íntimos, sinceros,
como quem mete o dedo no nariz.
Lá dentro não há nada que compense
todo esse trabalho de perfuratriz,
só muco e lero-lero.
Não faças poesias melodiosas
e frágeis como essas caixinhas de música
que tocam a 'Valsa do Imperador'.
É sempre a mesma lenga-lenga estúpida,
sentimental, melosa.
Esquece o eu, esse negócio escroto
e pegajoso, esse mal sem remédio
que suga tudo e não dá dá nada em troca
além de solidão e tédio:
escreve pros outros.
Mas se de tudo que há no vasto mundo
só gostas mesmo é dessa coisa falsa
que se disfarça fingindo se expressar,
então enfia o dedo no nariz, bem fundo,
e escreve, escreve até estourar. E tome valsa."
(De Artes e ofícios da poesia, organização de Augusto Massi, publicação da Secretaria Municipal de Cultura do município de São Paulo.)
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