segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Lírica (324) - A carta
Pressentiu que ele estava muito doente, e talvez até morto, quando, como fazia todas as noites, apanhou a última carta que ele lhe mandara, dois meses antes, de uma cidade qualquer de um país longínquo. Assim que pegou a carta, o papel ficara amarelo como o rosto dos cadáveres. Chorou sobre as letras que teciam juras de amor, retribuídas por ela em várias cartas que não haviam tido resposta, o que confirmava agora a suspeita de que ele estivesse doente, quem sabe morto, naquela cidade distante ou em outra à qual o tivesse levado seu trabalho de representante comercial. Durante muito tempo, aflita, procurou por todos os meios uma notícia. Um dia ela chegou, finalmente, quase por acaso. Ele não tinha morrido. Havia se casado no país longínquo e lá se estabelecera. Ela pegou então todas as cartas dele e as rasgou. Conservou só a última, porque dessa a mentira e o veneno haviam sido apagados pelas suas lágrimas antigas e também pelas recentes.
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