sexta-feira, 13 de agosto de 2010
Lírica (426) - O artista
O amor começou a subir a imensa escada que, para quem estava embaixo, e também para ele, entusiasmado com a própria façanha, parecia capaz de levá-lo ao céu, pelo menos às estrelas mais baixas. Em cada degrau, o amor fazia uma mesura, uma reverência ao público, que ia aplaudindo, com crescente força e generosidade, para que os aplausos fossem ouvidos mesmo à assombrosa altura que o amor ia atingindo. Já era difícil acompanhar as mesuras com que ele continuava a agradecer, à medida que subia mais e mais degraus. Por isso, organizou-se rapidamente um comércio de binóculos lá embaixo e cerca de cem foram vendidos. Foram seus compradores que avisaram aos outros que o amor havia chegado ao topo da escada e se confundia agora com a lua. Deles também veio a notícia de que algo estranho estava acontecendo. Ao fazer a última e triunfal reverência, o amor tropeçou no degrau supremo e veio caindo atabalhoadamente, desgraciosamente, como um artista medíocre. Levou quinze minutos para se estatelar na calçada, onde foi recebido com a vaia que como fanfarrão merecia.
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