terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Dois parágrafos de Margaret Atwood

"Todos os escritores aprendem com os mortos. Enquanto continuamos a escrever, continuamos a explorar o trabalho dos escritores que nos precederam; ao mesmo tempo nos sentimos julgados e responsabilizados por eles. Mas não aprendemos apenas com os escritores - podemos aprender com nossos antepassados. Porque os mortos controlam o passado, controlam as histórias, e também certas verdades - a que Wilfred Owen chamou no poema sobre sua descida aos Infernos, 'Strange meeting' (Estranho encontro), verdades não ditas -; portanto, se formos nos aventurar na narrativa, teremos de lidar, mais cedo ou mais tarde, com essas camadas anteriores do tempo. Mesmo que o tempo seja o de ontem apenas, já não é hoje. Não é o 'agora' em que estamos escrevendo.
Todos os escritores têm de passar do 'agora' para o 'era uma vez'; todos devem ir daqui para lá; todos devem descer até o lugar em que as histórias estão guardadas; todos devem cuidar para não serem capturados e imobilizados no passado. E todos precisam furtar ou recuperar, dependendo do ponto de vista. Os mortos podem guardar o tesouro, mas ele será inútil se não puder ser trazido de volta à terra dos vivos e reingressar no tempo - o que significa entrar para o domínio público, o domínio dos leitores, o domínio da mudança."

(Do livro de ensaios "Negociando com os mortos", traduzido por Lia Wyler, publicado pela Rocco.)

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