quinta-feira, 24 de abril de 2014
Ele disse
Ele disse que só abriria o coração à mulher que, vista pela primeira vez, despertasse nele a voz da brisa e dos violinos. Ele a encontrou certa manhã, e logo sentiu que só poderia ser ela a esperada, porque no seu peito começou a cantar um riacho, e um vento morno beijou as árvores da avenida, tirando de seus galhos um som agudo que somente se ouvira no tempo de Paganini. Ele acompanhou seus passos, que pareciam um esvoaçar de borboleta. Ele mesmo parecia esvoaçar agora. Viver era aquilo, enfim: estar leve, ser só espírito e essência. Andou por quarteirões que pareciam suspensos no céu da manhã. A mulher e ele eram agora fios de uma nuvem clara. E ele a seguiu assim, sem coragem de lhe dizer uma palavra. Ela o olhou e também não disse nada. Foram três minutos, talvez dois, ou um, em que os envolveu a epifania. Acordaram dela quando já os passos dos dois ressoavam não como o voo de duas borboletas sopradas por um violino, mas como os passos de um homem e uma mulher numa calçada. Não poderão jamais repetir aquele momento e, se forem minimamente sábios, jamais tentarão.
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