quarta-feira, 31 de agosto de 2016
Cotação do dia
Sinto-me como um morto provisório, um defunto em regime de experiência, ainda não autorizado a desfrutar de meu mais desejado direito: o de descansar em paz.
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Asco
Nos seus últimos dias, ele notou que não só as mulheres, mas também os objetos se furtavam ao contato dos seus dedos, já tocados por um prenúncio de morte. Assim que se aproximava deles, todos arranjavam um modo de atirar-se ao chão, como a bailarina de porcelana que se espatifou quando ele foi ajeitá-la na estante.
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Ontem
Já me dei melhor com a vida. Era uma época em que ela e eu ainda não estávamos cansados de fingir.
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Um trecho de Mariana Ianelli
"Marcel Storr tinha tudo para ser um derrotista. Bastava considerar os fatos. Filho da assistência pública (como Jean Genet), entregue para adoção pela própria mãe (como Jean Genet), meio surdo de uma trepanação que sofreu durante a infância, maltratado, pobre, sozinho, doente, gari do Bois de Boulogne. O derrotismo seria como um desdobramento óbvio."
(Da crônica "O fantástico mundo de um gari do Bois de Boulogne", do livro Meu sábado é o silêncio de um retrato, edição da Ardotempo.)
(Da crônica "O fantástico mundo de um gari do Bois de Boulogne", do livro Meu sábado é o silêncio de um retrato, edição da Ardotempo.)
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terça-feira, 30 de agosto de 2016
Dalton
Em qualquer personagem de Dalton Trevisan, até no mais inocente, a mão-boba tinha pelo menos dez dedos.
Presunção (para Patricia Mesquita)
Por uma mania da juventude, que laboriosamente fui transformando numa obsessão, incluo-me na categoria dos escritores e esforço-me para parecer um deles. Sou um exemplo de que a persistência, às vezes, é apenas uma palavra de doze letras, assim como a palavra insuficiente.
Soneto dos títulos meritórios (para o mísero ser humano Raul Drewnick)
Alguma coisa aprendeste
Em tudo quanto sonhaste,
Em tudo quanto falhaste,
Em tudo quanto sofreste?
Alguma lição colheste,
Algum proveito tiraste,
Ó ser inútil, ó traste,
Das ilusões em que creste?
Tantos sentimentos nobres
Te renderam simplesmente
Versos frouxos, rimas pobres
E o dom de seres chamado
De tolo, idiota, demente
E velho destrambelhado.
Em tudo quanto sonhaste,
Em tudo quanto falhaste,
Em tudo quanto sofreste?
Alguma lição colheste,
Algum proveito tiraste,
Ó ser inútil, ó traste,
Das ilusões em que creste?
Tantos sentimentos nobres
Te renderam simplesmente
Versos frouxos, rimas pobres
E o dom de seres chamado
De tolo, idiota, demente
E velho destrambelhado.
Curtíssimos de Dalton Trevisan
"Do último verão, no tronco da árvore, a casca vazia de uma cigarra: ouça o canto."
"Um bom conto é pico certeiro na veia."
"- O que eu sabia? Nadinha de nada. Tentei o Mobral e desisti numa semana. Daí conheci a Maria. Ler o corpo dela na cama foi a primeira lição: bo-ca,sei-o, pen-te.Com os números do seu telefone me ensinou a contar. E brincando com as letras do nome dela não é que eu aprendi a e-s-c-r-e-v-e-r?"
"- Tão triste, nem putinha devia ser. Puta é alegre, sempre às gargalhadas. Vestido vermelho, peito de fora. Olha só eu, ai de minzinha."
"Na noite branca da insônia você tenta uma por uma as 64 ciências e artes do Kama Sutra - nem assim atinge o prazer solitário do sono."
(De Pico na veia, Editora Record.)
"Um bom conto é pico certeiro na veia."
"- O que eu sabia? Nadinha de nada. Tentei o Mobral e desisti numa semana. Daí conheci a Maria. Ler o corpo dela na cama foi a primeira lição: bo-ca,sei-o, pen-te.Com os números do seu telefone me ensinou a contar. E brincando com as letras do nome dela não é que eu aprendi a e-s-c-r-e-v-e-r?"
"- Tão triste, nem putinha devia ser. Puta é alegre, sempre às gargalhadas. Vestido vermelho, peito de fora. Olha só eu, ai de minzinha."
"Na noite branca da insônia você tenta uma por uma as 64 ciências e artes do Kama Sutra - nem assim atinge o prazer solitário do sono."
(De Pico na veia, Editora Record.)
segunda-feira, 29 de agosto de 2016
Flerte
Se a literatura quer mesmo alguma coisa comigo, acho que já passou a hora de ela me fazer ao menos um sinal.
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Soneto da hora
O que iremos responder
Quando a Morte perguntar
Se temos algo a dizer,
Quando ela nos convocar?
Ela há de querer saber,
Porque isso é protocolar,
Se nós vamos recorrer
E uma queixa apresentar.
Nós lhe diremos então
Que a única contestação,
Mais do que justificada,
Seria a de criticá-la,
Maldizê-la e condená-la
Por ter chegado atrasada.
Quando a Morte perguntar
Se temos algo a dizer,
Quando ela nos convocar?
Ela há de querer saber,
Porque isso é protocolar,
Se nós vamos recorrer
E uma queixa apresentar.
Nós lhe diremos então
Que a única contestação,
Mais do que justificada,
Seria a de criticá-la,
Maldizê-la e condená-la
Por ter chegado atrasada.
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Literatura
"Gênese feminina", de Lourença Lou
"a mulher
saiu de uma costela
porque não cabia ser inventada
ultrapassa os limites da imaginação."
(Do livro Equilibrista, Editora Penalux.)
saiu de uma costela
porque não cabia ser inventada
ultrapassa os limites da imaginação."
(Do livro Equilibrista, Editora Penalux.)
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domingo, 28 de agosto de 2016
Simonia (para Marcelo Mirisola)
Descrever o próprio sofrimento pode até ser literatura, mas é sem dúvida quase uma abjeção. É como se a alma tivesse nádegas e nós as mostrássemos ao público, passando depois o chapéu.
Revista Rubem
Hoje esparramo na página (www.rubem.wordpress.com) mais uns estilhaços de alma (ou de seja lá o que for que me dói tanto).
Um trecho de "O livro dos sonhos", de Jack Kerouac
"Estou em minha mesa de trabalho na manhã chuvosa de uma Manhattan envolta em neblina; olho lá embaixo para o lado do cais do porto e vejo navios da Marinha ancorados no trapiche e multidões de marinheiros caminhando por cima da água em direção à terra firme. Digo: 'Todo mundo já aprendeu como se faz - parece fácil - até demais - deve ser um truque bem simples'".
sábado, 27 de agosto de 2016
Soneto das contas do amor (para Zelda Kahlo)
No seu bloquinho pautado,
Com a melhor letra que tem,
O amor registrando vem
Aquilo que nos tem dado.
Em nossa conta lançou
Os beijos, desde o primeiro,
Abraços, mais de um milheiro,
E tudo mais que anotou.
Quando nos abandonar,
Certamente irá cobrar,
Com sua alma de usurário,
Daquilo que marcou, tudo:
Até o gato felpudo
Que nos deu no aniversário.
Com a melhor letra que tem,
O amor registrando vem
Aquilo que nos tem dado.
Em nossa conta lançou
Os beijos, desde o primeiro,
Abraços, mais de um milheiro,
E tudo mais que anotou.
Quando nos abandonar,
Certamente irá cobrar,
Com sua alma de usurário,
Daquilo que marcou, tudo:
Até o gato felpudo
Que nos deu no aniversário.
Vício
O problema dos escritores é que, mesmo quando nada têm a dizer, se sentem obrigados a dizê-lo.
Norma
Diante de uma rosa, um poeta só deverá se pronunciar se puder, honestamente, crer em sua capacidade de aperfeiçoar a perfeição.
Um soneto de Shakespeare
"Quando vejo nas crônicas antigas
A descrição dos seres mais perfeitos,
E o belo a embelezar velhas cantigas
Em honra à dama e aos paladins eleitos,
No blasonar da formosura rara
Que em mãos, pés, lábios, olhos, face aflora,
Sinto que a musa antiga decantara
Mesmo a beleza que deténs agora.
Não passa tal louvor de profecia
Do nosso tempo, e já te prefigura;
Mas como só na mente é que te via,
Não pode o teu valor cantar à altura.
E hoje, que temos olhos para ver,
Verbo nos falta para enaltecer."
(Tradução de Ivo Barroso, de Obra completa, Editora Abril.)
A descrição dos seres mais perfeitos,
E o belo a embelezar velhas cantigas
Em honra à dama e aos paladins eleitos,
No blasonar da formosura rara
Que em mãos, pés, lábios, olhos, face aflora,
Sinto que a musa antiga decantara
Mesmo a beleza que deténs agora.
Não passa tal louvor de profecia
Do nosso tempo, e já te prefigura;
Mas como só na mente é que te via,
Não pode o teu valor cantar à altura.
E hoje, que temos olhos para ver,
Verbo nos falta para enaltecer."
(Tradução de Ivo Barroso, de Obra completa, Editora Abril.)
sexta-feira, 26 de agosto de 2016
Que o amor tenha piedade de nós
Hoje, no portal do Estadão, falo do mais amado dos tiranos.
http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/escreviver/o-que-o-amor-pode
http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/escreviver/o-que-o-amor-pode
Emily Dickinson, por Mariana Ianelli
"Desde que a irmã descobriu seu tesouro milionário de poemas, naqueles célebres sessenta volumes atados, a fama não demorou a invadir o espaço privado de Emily Dickinson. As publicações, que em vida nunca haviam acontecido senão anonimamente, começam a borbotar já em 1890, multiplicando-se em reedições, até se tornar mundialmente público, às portas do novo século, o mito da solitária de Amherst, a grande reclusa."
(Do livro Para aqueles a quem os dias são um sopro, edição da ardotempo.)
(Do livro Para aqueles a quem os dias são um sopro, edição da ardotempo.)
quinta-feira, 25 de agosto de 2016
A verdade
Só depois de ela deixar-nos
Soubemos que a juventude
Foi sempre a única virtude
De que pudemos gabar-nos.
Soubemos que a juventude
Foi sempre a única virtude
De que pudemos gabar-nos.
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Utilidade
Se o amor não nos come a paz
Nem devora o coração,
Para que serve, o que faz
Esse merda, esse poltrão?
Nem devora o coração,
Para que serve, o que faz
Esse merda, esse poltrão?
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De Luiz Zanin Oricchio sobre Woody Allen
"Não se pode dizer que o cinema de Woody Allen seja otimista - ele é inteligente demais para isso."
("Caderno 2" do Estadão, 24/8/2016.)
("Caderno 2" do Estadão, 24/8/2016.)
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quarta-feira, 24 de agosto de 2016
Um livro de poesia (para Silvia Galant François)
Um livro de poesia deve estar sempre no alto da estante e perto da janela, como se fosse, ou possa vir a ser, um pássaro. Se for um livro de Mario Quintana, a janela há de estar permanentemente aberta.
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"Fuga à hora de dormir", de Robert Louis Stevenson
"As luzes da sala e da cozinha brilhavam
Através dos estores, das janelas e das grades;
E ao alto em toda a volta
Havia milhões de estrelas.
Nunca houve tantos milhares de folhas numa árvore,
Nem tantas pessoas na igreja ou no parque,
Como essas estrelas que me contemplavam
Brilhando e cintilando na escuridão.
O Cão, o Arado e o Caçador, e todas as outras,
E a estrela do marinheiro, e Marte,
Brilhavam no céu, e o balde junto ao muro
Estava meio cheio de água e estrelas.
Por fim meteram-me na cama
Quando me viram, perseguindo-me com gritos.
Mas a glória continuou a brilhar, iluminando os meus olhos,
E as estrelas continuaram à volta na minha cabeça."
(De Poemas de Robert Louis Stevenson, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Através dos estores, das janelas e das grades;
E ao alto em toda a volta
Havia milhões de estrelas.
Nunca houve tantos milhares de folhas numa árvore,
Nem tantas pessoas na igreja ou no parque,
Como essas estrelas que me contemplavam
Brilhando e cintilando na escuridão.
O Cão, o Arado e o Caçador, e todas as outras,
E a estrela do marinheiro, e Marte,
Brilhavam no céu, e o balde junto ao muro
Estava meio cheio de água e estrelas.
Por fim meteram-me na cama
Quando me viram, perseguindo-me com gritos.
Mas a glória continuou a brilhar, iluminando os meus olhos,
E as estrelas continuaram à volta na minha cabeça."
(De Poemas de Robert Louis Stevenson, tradução de José Agostinho Baptista, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
terça-feira, 23 de agosto de 2016
Um trecho de "Aurélia", de Gérard de Nerval
"Mas, para o coração profundamente apaixonado, o excesso de emoção contrai num instante todos os impulsos vitais; a desordem é grande, a convulsão profunda, a cabeça se curva estremecendo como sob o sopro de um Deus. Ai de nós! o que somos, pobres criaturas! Como responder dignamente ao poder de sentir, incutido em nossa alma pelo céu? Sou apenas um homem, a senhora uma mulher... e o amor que há entre nós tem algo de imperecível e de divino."
(Tradução de Luís Augusto Contador Borges, edição da Iluminuras.)
(Tradução de Luís Augusto Contador Borges, edição da Iluminuras.)
segunda-feira, 22 de agosto de 2016
Soneto autobiográfico (versão final)
Escrever para quê? Para deixar
Um registro da minha iniquidade,
Do meu rancor, da minha falsidade,
De como pode alguém se degradar?
Escrever para quê? Para narrar
Como em mim foi postiça a dignidade
E como foi a marca da maldade
A que melhor em mim veio a calhar?
À arte me dediquei, sonhei com uma obra,
Por elas dei o coração e a vida,
E agora tudo que de tudo sobra
São os poemas no micro, abarrotado,
Nos quais eu conto, como neste, a lida
De um homem nulo e um poeta fracassado.
Um registro da minha iniquidade,
Do meu rancor, da minha falsidade,
De como pode alguém se degradar?
Escrever para quê? Para narrar
Como em mim foi postiça a dignidade
E como foi a marca da maldade
A que melhor em mim veio a calhar?
À arte me dediquei, sonhei com uma obra,
Por elas dei o coração e a vida,
E agora tudo que de tudo sobra
São os poemas no micro, abarrotado,
Nos quais eu conto, como neste, a lida
De um homem nulo e um poeta fracassado.
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Penúltimos metros
A ideia, no começo, era escrever menos, para escrever melhor. Agora é parar de vez, para não escrever pior ainda.
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Ruth Manus
A cada domingo, mais fã me torno dessa nova cronista do Estadão. Salve, Ruth!
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Futuro
Talvez venhamos a descobrir um dia o que os leitores há muito já sabem: não somos escritores.
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Uma frase de Liberato Vieira da Cunha
"É esse o problema com o túnel do tempo. Sempre desemboca na novela das nove."
(Do livro de crônicas O silêncio do mundo, Editora AGE.)
(Do livro de crônicas O silêncio do mundo, Editora AGE.)
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domingo, 21 de agosto de 2016
O momento
"Você escreve?", ela me perguntou. Eu disse que sim, e me fixei nos seus cabelos, nos olhos, nos lábios que continuavam a me falar, falar, se bem que eu não ouvisse senão a música que vinha deles. Nesse instante eu soube qual seria o tema de tudo quanto eu escreveria pelo resto da vida.
Agenda
Mudar tudo
mudar-me todo
Não ser mais
esta burla
este engodo
este ramerrão
esta repetição
este rádio
tocando música
para um defunto surdo
no caixão.
mudar-me todo
Não ser mais
esta burla
este engodo
este ramerrão
esta repetição
este rádio
tocando música
para um defunto surdo
no caixão.
Um poema de Tu Fu
"Criar uma filha para casá-la com um soldado. Antes abandoná-la na estrada, ao nascer!
Senhor, trancei meus cabelos, no dia do casamento, mas o nosso leito não teve tempo de se aquecer. Ao cair do sol, tornei-me vossa esposa, e logo nos separamos, às primeiras luzes da aurora!
Agora, penso na morte que vos ameaça a cada instante. Vivo em agonia. Meu coração se despedaça.
Tinha prometido a mim mesma acompanhar-vos por toda parte... Percebi que a minha presença vos aumentaria os cuidados.
Não pronuncieis com muita frequência o nome de vossa jovem esposa. Esforçai-vos por esquecer tudo o que não seja vosso dever de soldado."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, Editora Nova Fronteira.)
Senhor, trancei meus cabelos, no dia do casamento, mas o nosso leito não teve tempo de se aquecer. Ao cair do sol, tornei-me vossa esposa, e logo nos separamos, às primeiras luzes da aurora!
Agora, penso na morte que vos ameaça a cada instante. Vivo em agonia. Meu coração se despedaça.
Tinha prometido a mim mesma acompanhar-vos por toda parte... Percebi que a minha presença vos aumentaria os cuidados.
Não pronuncieis com muita frequência o nome de vossa jovem esposa. Esforçai-vos por esquecer tudo o que não seja vosso dever de soldado."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, Editora Nova Fronteira.)
Soneto de quem pecou contra a poesia
Pagarei por meus pecados
E minhas infraçõezinhas:
Os sonetos descarados
E as presunçosas quadrinhas.
E, por ser esse o correto,
Igualmente pagarei
O preço justo e completo
Pelos cisnes que matei.
Que outra atitude há de ter
Quem não conseguiu fazer
Da incomparável poesia
(Das artes a mais formosa)
Nem uma dama virtuosa
Nem uma puta vadia?
E minhas infraçõezinhas:
Os sonetos descarados
E as presunçosas quadrinhas.
E, por ser esse o correto,
Igualmente pagarei
O preço justo e completo
Pelos cisnes que matei.
Que outra atitude há de ter
Quem não conseguiu fazer
Da incomparável poesia
(Das artes a mais formosa)
Nem uma dama virtuosa
Nem uma puta vadia?
sábado, 20 de agosto de 2016
Filosofia (para Patricia Mesquita)
A terra sempre se ri
quando armamos
aquela cara séria
e perguntamos:
para onde vamos?
quando armamos
aquela cara séria
e perguntamos:
para onde vamos?
Encontro
Se eu quiser falar
com os da minha geração
terei que visitá-los
no cemitério da consolação.
com os da minha geração
terei que visitá-los
no cemitério da consolação.
O sentido
Por mais que tenhas lido
por mais que tenhas aprendido
por mais que tenhas vivido
será nenhum teu saber
se não tiveres compreendido
que o único sentido
da vida é morrer.
por mais que tenhas aprendido
por mais que tenhas vivido
será nenhum teu saber
se não tiveres compreendido
que o único sentido
da vida é morrer.
"Três velhas senhoras", de Pedro Gonzaga
"três velhas senhoras jogam baralho
as mãos gastas pela vida
grandes anéis de ouro
salvos para a ocasião -
velhas senhoras sabiam economizar
não ouço o que dizem
não sei quais as regras vigentes
movem os dedos com uma rapidez
e alegria que os meus desconhecem."
(Do livro Falso começo, edição da ardotempo.)
as mãos gastas pela vida
grandes anéis de ouro
salvos para a ocasião -
velhas senhoras sabiam economizar
não ouço o que dizem
não sei quais as regras vigentes
movem os dedos com uma rapidez
e alegria que os meus desconhecem."
(Do livro Falso começo, edição da ardotempo.)
sexta-feira, 19 de agosto de 2016
O sexto
De todos, o mais metido,
Arrogante, presunçoso,
Enfatuado e pretensioso
É sempre o sexto sentido.
Arrogante, presunçoso,
Enfatuado e pretensioso
É sempre o sexto sentido.
Mario Quintana
Mario Quintana era a camisa esporte que a poesia usava quando não queria vestir traje social.
Soneto da imerecida glória
Tolo, como não te cansas,
Já no final de tua vida,
De cultivar esperanças
De uma glória imerecida?
Como podes ainda crer,
Em tua última estação,
Que conseguirás obter
Uma injusta floração?
Sempre foste só um farsante
Que do seu papel gostou
E levou a farsa adiante.
Merece ser vitorioso
Quem ser grande simulou?
Mereces tu, mentiroso?
Já no final de tua vida,
De cultivar esperanças
De uma glória imerecida?
Como podes ainda crer,
Em tua última estação,
Que conseguirás obter
Uma injusta floração?
Sempre foste só um farsante
Que do seu papel gostou
E levou a farsa adiante.
Merece ser vitorioso
Quem ser grande simulou?
Mereces tu, mentiroso?
"Poema em dez versos", de Pablo Neruda
"Era meu coração uma asa viva e turva
e pavorosa asa de sonho.
Era ainda Primavera sobre os campos verdes.
Azul se fazia a altura e esmeralda era o solo.
Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
Ainda recordo seus olhos em desconsolo.
Ela - a que me amava - fechou os olhos. Tarde.
Tarde de campo, azul. Tarde de voos e véus.
Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
A Primavera a levou direto ao céu."
De Crepusculário, tradução de José Eduardo Degrazia, edição da L&PM.)
e pavorosa asa de sonho.
Era ainda Primavera sobre os campos verdes.
Azul se fazia a altura e esmeralda era o solo.
Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
Ainda recordo seus olhos em desconsolo.
Ela - a que me amava - fechou os olhos. Tarde.
Tarde de campo, azul. Tarde de voos e véus.
Ela - a que me amava - morreu na Primavera.
A Primavera a levou direto ao céu."
De Crepusculário, tradução de José Eduardo Degrazia, edição da L&PM.)
quinta-feira, 18 de agosto de 2016
Cotação do dia
Aquela decepção que sentimos diante de mais uma prova de que os outros são mesmo nossos semelhantes, no pior que temos: ódio, rancor, intolerância.
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Efeméride
Sente que hoje é um dia especial
e saberia até dizer por quê,
se em sua demência senil
18 de agosto não fosse igual
a 31 de fevereiro
a 84 de janeiro
ou a 1º de abril.
e saberia até dizer por quê,
se em sua demência senil
18 de agosto não fosse igual
a 31 de fevereiro
a 84 de janeiro
ou a 1º de abril.
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Bom tempo
Um dia
Drummond perdeu
o bonde e a esperança.
Bom tempo para viver
foi esse em que ainda havia
bondes e esperanças
para se perder.
Drummond perdeu
o bonde e a esperança.
Bom tempo para viver
foi esse em que ainda havia
bondes e esperanças
para se perder.
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"Dias de junho de 1941", de Giorgios Seferis
"A nova lua ergueu-se sobre Alexandria
Trazendo a antiga nos braços
E nós, caminhando para a Porta do Sol,
Na obscuridade do sol, três amigos.
Quem quer banhar-se hoje nas águas de Proteu?
A metamorfose nós a procuramos em nossa mocidade,
Cheios de desejos saltando como grandes peixes
Em mares na vazante abrupta;
Acreditávamos na potência total do corpo.
Agora a nova lua cresce, estreitando
A lua antiga; e a bela ilha ferida
Repousa em seu sangue, a ilha aprazível, a ilha forte, inocente.
E os corpos como ramos saqueados,
Raízes extirpadas.
Nossa sede
Sentinela a cavalo, parada
Diante da Porta do Sol
Nada sabe pedir: ela se defende
exilada nesse lugar, em qualquer parte,
Junto ao túmulo de Alexandre."
(Tradução de Darcy Damasceno, série Prêmios Nobel de Literatura, publicação da Editora Delta.)
Trazendo a antiga nos braços
E nós, caminhando para a Porta do Sol,
Na obscuridade do sol, três amigos.
Quem quer banhar-se hoje nas águas de Proteu?
A metamorfose nós a procuramos em nossa mocidade,
Cheios de desejos saltando como grandes peixes
Em mares na vazante abrupta;
Acreditávamos na potência total do corpo.
Agora a nova lua cresce, estreitando
A lua antiga; e a bela ilha ferida
Repousa em seu sangue, a ilha aprazível, a ilha forte, inocente.
E os corpos como ramos saqueados,
Raízes extirpadas.
Nossa sede
Sentinela a cavalo, parada
Diante da Porta do Sol
Nada sabe pedir: ela se defende
exilada nesse lugar, em qualquer parte,
Junto ao túmulo de Alexandre."
(Tradução de Darcy Damasceno, série Prêmios Nobel de Literatura, publicação da Editora Delta.)
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quarta-feira, 17 de agosto de 2016
Duplo
Se alguém isso esclareceu,
Foi de maneira bem vaga.
Marília era de Dirceu,
Até aí tudo bem.
Mas quem é que era, então, hem,
Tomás Antônio Gonzaga?
Foi de maneira bem vaga.
Marília era de Dirceu,
Até aí tudo bem.
Mas quem é que era, então, hem,
Tomás Antônio Gonzaga?
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"Antes deles", de Pedro Gonzaga
"saudosos poetas da pérsia
saudosos trovadores que
inventaram o olhar
longas eram as festas
longas as assembleias
as peles não tinham cor
os cabelos metais foscos
as bocas flores mudas
os perfumes sem nome
toda mulher nenhuma
antes deles
não ardia nas pupilas
a umidade."
(Do livro Falso começo, edição da Ardotempo.)
saudosos trovadores que
inventaram o olhar
longas eram as festas
longas as assembleias
as peles não tinham cor
os cabelos metais foscos
as bocas flores mudas
os perfumes sem nome
toda mulher nenhuma
antes deles
não ardia nas pupilas
a umidade."
(Do livro Falso começo, edição da Ardotempo.)
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terça-feira, 16 de agosto de 2016
O perigo (para Deonísio Da Silva)
As frases mais perigosas são aquelas em que há uma crase mal-intencionada e um sujeito oculto.
"Rosa vermelha", de Li Po
"A esposa do guerreiro está sentada à janela.
De coração aflito, borda uma rosa branca numa almofada de seda.
Picou-se no dedo! Seu sangue corre na rosa branca, que se torna vermelha.
Seu pensamento vai ter com seu amado, que está na guerra
e cujo sangue tinge, talvez, a neve de vermelho.
Ouve o galope de um cavalo... Chega, enfim, seu amado?
É apenas o coração que lhe salta com força no peito...
Curva-se mais sobre a almofada e borda com prata
as lágrimas que cercam a rosa vermelha."
(De Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
De coração aflito, borda uma rosa branca numa almofada de seda.
Picou-se no dedo! Seu sangue corre na rosa branca, que se torna vermelha.
Seu pensamento vai ter com seu amado, que está na guerra
e cujo sangue tinge, talvez, a neve de vermelho.
Ouve o galope de um cavalo... Chega, enfim, seu amado?
É apenas o coração que lhe salta com força no peito...
Curva-se mais sobre a almofada e borda com prata
as lágrimas que cercam a rosa vermelha."
(De Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
segunda-feira, 15 de agosto de 2016
Soneto dos passos do amor (versão final) - Para Zelda Kahlo
Para a dor e o desalento,
Para a mortificação,
Para o conselho malsão
E o desencaminhamento,
Para o suplício e o tormento,
Para o infortúnio, a aflição,
Para o sofrimento vão
E para o aniquilamento.
Para a moléstia sem cura,
Para a agonia, a loucura,
As desgraças e os fracassos,
Para a cama de hospital,
Para o desfecho fatal,
O amor conduz nossos passos.
Para a mortificação,
Para o conselho malsão
E o desencaminhamento,
Para o suplício e o tormento,
Para o infortúnio, a aflição,
Para o sofrimento vão
E para o aniquilamento.
Para a moléstia sem cura,
Para a agonia, a loucura,
As desgraças e os fracassos,
Para a cama de hospital,
Para o desfecho fatal,
O amor conduz nossos passos.
Trio dourado
Ontem, o Verissimo, o Leandro Karnal e a soberba Ruth Manus tornaram maravilhoso o domingo para quem leu o Estadão.
Confissão
Venho usando o blog como se fosse um confessionário. Dispo-me, exibo-me e - até quando minto - revelo-me. Há muito tempo sei que meus textos são muito menos valiosos para os amantes da literatura que para os estudiosos do cérebro humano e de seus distúrbios.
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Sobre mérito
Que Deus tenha compaixão de mim, se quiser. Não serei eu que irei pedi-la. Conheço-me muito bem. Ninguém melhor que eu sabe que não a mereço. Fui um homem medíocre e um escritor desprezível.
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Ser ou não ser
Ao contrário do que pensam,
Talvez, afinal, morrer,
Possa diferente ser,
Quem sabe até uma bênção.
Talvez, afinal, morrer,
Possa diferente ser,
Quem sabe até uma bênção.
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Um e outro
O romancista põe-se na pele de personagens que fazem tudo, realizam tudo, conquistam tudo que ele sonha fazer, realizar e conquistar. O poeta escolhe para representá-lo quem possa ser derrotado, aniquilado e ultrajado como ele gostaria de ser.
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Triste
Triste é alguém ter, já no fim da vida, a literatura como única esperança, não mais de glória ou realização, mas de puro, simples, amargo e insuficiente alívio.
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Mario Quintana
Em Mario Quintana, a beleza aparenta sempre ser só uma das faces da simplicidade.
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Alerta
Tudo que em nós não estiver a serviço da beleza haverá de ser posto sob suspeita.
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"Canto de guerra", de Li Po
"Na fronteira do Sul, aos pés da montanha,
parece um campo de neve.
Nos muros da cidade rendida,
o luar parece geada.
Ouviu-se um toque de corneta, à noite.
E a noite inteira os soldados do Norte
olharam com saudade em direção às suas casas."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
parece um campo de neve.
Nos muros da cidade rendida,
o luar parece geada.
Ouviu-se um toque de corneta, à noite.
E a noite inteira os soldados do Norte
olharam com saudade em direção às suas casas."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
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domingo, 14 de agosto de 2016
Revista Rubem
Meu texto de hoje (www.rubem.wordpress.com) é todo feito de fragmentos, bem de acordo com o homem que sou, quebrado, disperso, irrecolhível. Com esses restos não há de se montar nem um jarro em que eu pudesse beber a pura água que almejei beber outrora.
Algo mais
A técnica, o método e o trabalho são importantes na formação de um poeta. Mas um grande poeta, um poeta verdadeiramente extraordinário sempre tem um atributo impossível de definir, algo em que os antigos viam uma intromissão dos deuses - uma visão que talvez ainda hoje possa considerar-se correta.
Do amor
Do amor, ontem importante,
Ninguém hoje quer saber.
Hoje ninguém quer ser Dante,
Beatriz ninguém mais quer ser.
Ninguém hoje quer saber.
Hoje ninguém quer ser Dante,
Beatriz ninguém mais quer ser.
"A dança dos deuses", de Li Po
"Pus toda a minha alma numa canção
que cantei para os homens. E os homens se riram!
Tomei meu alaúde, fui sentar-me no topo de uma montanha
e cantei para os deuses a canção que os homens
não tinham entendido.
O sol baixava. Ao ritmo da minha canção, os Deuses dançaram
nas nuvens encarnadas que flutuavam no céu."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
que cantei para os homens. E os homens se riram!
Tomei meu alaúde, fui sentar-me no topo de uma montanha
e cantei para os deuses a canção que os homens
não tinham entendido.
O sol baixava. Ao ritmo da minha canção, os Deuses dançaram
nas nuvens encarnadas que flutuavam no céu."
(Do livro Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
sábado, 13 de agosto de 2016
Na real (para Ana Farrah Baunilha)
De quando em quando, é preciso relermos Roberto Piva, para que a nossa poesia possa mostrar sua face molecona e, puxando para cima sua saia de primeira comunhão, agachar-se no mato e fazer um suspirado xixizinho.
Oração
Da literatura, origem de todos os meus males, espero que, se não os curar, os faça ter algum sentido.
Dois poemas de Li Po
"A UMA BELDADE DO CAMINHO
O cavaleiro pisa altivamente as flores caídas.
Seu chicote vai roçar a elegante carruagem.
A beldade sorri, levantando a cortina de pérolas,
e com o dedo aponta, ao longe, seu Pavilhão vermelho."
"MELANCOLIA (LAMENTO)
A nova é adorável como a flor.
Mas a antiga é preciosa como o jade.
Ondulante, a flor não se sabe conter.
Puro, o jade não muda.
A que hoje é antiga foi nova, outrora.
A nova será antiga, um dia,
Vede a casa de ouro da Rainha Ch'en:
nascem teias de aranha em sua cortinas silenciosas."
(De Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
O cavaleiro pisa altivamente as flores caídas.
Seu chicote vai roçar a elegante carruagem.
A beldade sorri, levantando a cortina de pérolas,
e com o dedo aponta, ao longe, seu Pavilhão vermelho."
"MELANCOLIA (LAMENTO)
A nova é adorável como a flor.
Mas a antiga é preciosa como o jade.
Ondulante, a flor não se sabe conter.
Puro, o jade não muda.
A que hoje é antiga foi nova, outrora.
A nova será antiga, um dia,
Vede a casa de ouro da Rainha Ch'en:
nascem teias de aranha em sua cortinas silenciosas."
(De Poemas chineses, tradução de Cecília Meireles, publicação da Editora Nova Fronteira.)
sexta-feira, 12 de agosto de 2016
Com jeito de haicai (para Celina Portocarrero)
Sentadas à mesa
as quatro cadeiras conversam
e lembram com tristeza
dos seus jovens dias
quando na floresta
o vento as cortejava
e o sol as seduzia.
as quatro cadeiras conversam
e lembram com tristeza
dos seus jovens dias
quando na floresta
o vento as cortejava
e o sol as seduzia.
quinta-feira, 11 de agosto de 2016
Soneto do grão-senhor
Então nós nos disporemos
Mais uma vez a julgar
Possível o amor perdoar
Pelos males que sofremos.
Novamente ofertaremos,
Sem nem sequer negociar,
O que nos custou juntar
E o que jamais juntaremos.
O amor, nosso grão-senhor,
Aceitará sem pudor,
Assim como sempre fez.
E como sempre dirá
Que nunca mais nos trairá
Como nessa última vez.
Mais uma vez a julgar
Possível o amor perdoar
Pelos males que sofremos.
Novamente ofertaremos,
Sem nem sequer negociar,
O que nos custou juntar
E o que jamais juntaremos.
O amor, nosso grão-senhor,
Aceitará sem pudor,
Assim como sempre fez.
E como sempre dirá
Que nunca mais nos trairá
Como nessa última vez.
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Quatro versos de Friedrich Hölderlin
"E agora propõe-se honrar seriamente os deuses bem-aventurados,
Tudo deve proclamar o seu louvor em realidade e em verdade.
Não deverá ver a luz do dia tudo o que não agradar aos deuses do alto.
Para o Éter nenhum valor tem o que é vão."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
Tudo deve proclamar o seu louvor em realidade e em verdade.
Não deverá ver a luz do dia tudo o que não agradar aos deuses do alto.
Para o Éter nenhum valor tem o que é vão."
(De Elegias, tradução de Maria Teresa Dias Furtado, edição da Assírio & Alvim, Lisboa.)
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quarta-feira, 10 de agosto de 2016
O momento
Quantos vocês já não viram sorrindo assim, sem lhes dar atenção? No entanto, um mês, um ano depois, eles não podiam mais sorrir para ninguém. Se pretendem retribuir, agora é o momento.
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Logística
Quem diria.
Há muito mais estrelas no céu
Do que nossa van transportaria.
Há muito mais estrelas no céu
Do que nossa van transportaria.
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Hem?
Talvez eu tenha morrido
no dia em que você me disse
acabou
Foi num tempo
já muito ido e transcorrido
eu sei
mas você não notou?
no dia em que você me disse
acabou
Foi num tempo
já muito ido e transcorrido
eu sei
mas você não notou?
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Isso ou então
Eu escrevia muito melhor quando tinha dezoito anos. Ou era um leitor muito mais condescendente.
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Dois pesos (para o Marcelo Mirisola)
Uma vida toda
dedicada à poesia
vale mais que uma inteira
dedicada à marcenaria?
dedicada à poesia
vale mais que uma inteira
dedicada à marcenaria?
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"Quixote e Pinóquio", de Sergio Lara
"Sou metade Quixote
outra Pinóquio
tramando mentiras
e atos heroicos
entre Gepetos
e moinhos de vento
Sou de cinema, teatro,
artista plástico, maestro, letrado
fenômeno de mídia, sucesso no show-bizz
(por mais que cresça o meu nariz...)
Sou alma
de madeira rasa
noturno cavaleiro andante
Ah, quem me dera
possuir Dulcineia, ou ter
um amigo, Grilo-Falante."
(Do livro Não houvesse tabaco e outros poemas, edição da Scortecci.)
outra Pinóquio
tramando mentiras
e atos heroicos
entre Gepetos
e moinhos de vento
Sou de cinema, teatro,
artista plástico, maestro, letrado
fenômeno de mídia, sucesso no show-bizz
(por mais que cresça o meu nariz...)
Sou alma
de madeira rasa
noturno cavaleiro andante
Ah, quem me dera
possuir Dulcineia, ou ter
um amigo, Grilo-Falante."
(Do livro Não houvesse tabaco e outros poemas, edição da Scortecci.)
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terça-feira, 9 de agosto de 2016
Soneto do maior pecado
Querida, nossos pecados,
Queiramos nós dois, ou não,
Um dia todos serão
Sem nenhum perdão cobrados.
Não temos nada a alegar.
As normas nós conhecíamos,
As leis não desconhecíamos,
Não devíamos pecar.
O que me fez pecador,
O que te fez pecadora,
Não foi propriamente o amor.
Foi termos amor jurado,
E eu, traidor, e tu, traidora,
Termos a jura olvidado.
Queiramos nós dois, ou não,
Um dia todos serão
Sem nenhum perdão cobrados.
Não temos nada a alegar.
As normas nós conhecíamos,
As leis não desconhecíamos,
Não devíamos pecar.
O que me fez pecador,
O que te fez pecadora,
Não foi propriamente o amor.
Foi termos amor jurado,
E eu, traidor, e tu, traidora,
Termos a jura olvidado.
Ponto de ônibus
"Nossa! Fazia tempo que eu não te via. Uns dois meses, por aí."
"Mais. Três."
"Você está bem. Emagreceu, né? Onde você esteve todo esse tempo? Viajando?"
"Não. No hospital. Em estado de coma."
"Ah."
"Mais. Três."
"Você está bem. Emagreceu, né? Onde você esteve todo esse tempo? Viajando?"
"Não. No hospital. Em estado de coma."
"Ah."
"Dentro da noite", de Pedro Gonzaga
"avanças sobre mim
refulgem teus cabelos
feito alguma coisa líquida
recolho teus seios
prova e refutação
de leis de gabinete
teus lábios amorosos
aquilo que de flor
pode haver na carne
em meu corpo
tuas mãos são algas
que o mar movimenta
na fúria branca
das superfícies
na lenta imensidão
das profundidades."
(Do livro Falso começo, edição da Ardotempo.)
refulgem teus cabelos
feito alguma coisa líquida
recolho teus seios
prova e refutação
de leis de gabinete
teus lábios amorosos
aquilo que de flor
pode haver na carne
em meu corpo
tuas mãos são algas
que o mar movimenta
na fúria branca
das superfícies
na lenta imensidão
das profundidades."
(Do livro Falso começo, edição da Ardotempo.)
segunda-feira, 8 de agosto de 2016
"Humanidade", de Georg Trakl
"Humanidade posta ante abismos de chama,
Um rufo de tambores, frontes de guerreiros tenebrosos,
Passos pela névoa de sangue; negro ferro exclama;
Desespero, noite em cérebros pesarosos:
aqui a sombra de Eva, caça e rubra dinheirama.
Nuvens que a luz atravessa, vespertina refeição.
Em pão e vinho deve um doce silêncio residir.
E aqueles lá reunidos, doze são.
À noite sob ramos de oliveira gritam ao dormir;
São Tomé mergulha na ferida a mão."
(Do livro De profundis, tradução de Claudia Cavalcanti, edição da Iluminuras.)
Um rufo de tambores, frontes de guerreiros tenebrosos,
Passos pela névoa de sangue; negro ferro exclama;
Desespero, noite em cérebros pesarosos:
aqui a sombra de Eva, caça e rubra dinheirama.
Nuvens que a luz atravessa, vespertina refeição.
Em pão e vinho deve um doce silêncio residir.
E aqueles lá reunidos, doze são.
À noite sob ramos de oliveira gritam ao dormir;
São Tomé mergulha na ferida a mão."
(Do livro De profundis, tradução de Claudia Cavalcanti, edição da Iluminuras.)
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domingo, 7 de agosto de 2016
Se ainda
Já passou muito tempo.
Nem sabemos mais muito bem
se os temos ainda e quais
são nossos ideais.
Mas continuamos
com aquele ar misterioso
que costumam ter os poetas
os loucos e os profetas
e que quase sempre
é a única virtude que eles têm.
Nem sabemos mais muito bem
se os temos ainda e quais
são nossos ideais.
Mas continuamos
com aquele ar misterioso
que costumam ter os poetas
os loucos e os profetas
e que quase sempre
é a única virtude que eles têm.
Indícios
Deve estar mal, nas últimas talvez. Cada dia lhe falam mais de Deus e de como Ele sabe o que faz.
Sonetos? (Para Mariana Ianelli e Alfredo Aquino)
Apesar de ser onisciente, na entrevista de admissão Deus me perguntará:
"O que você fazia lá embaixo?"
"Sonetos."
"Sonetos? Sonetos?"
Pensará um pouco, localizará a palavra no Seu cérebro e me fitará com aquela Sua compaixão.
"O que você fazia lá embaixo?"
"Sonetos."
"Sonetos? Sonetos?"
Pensará um pouco, localizará a palavra no Seu cérebro e me fitará com aquela Sua compaixão.
O mau aluno (para Adriane Garcia e Líria Porto)
Tantas vezes
foi o jarro à fonte
que deveria saber já o caminho
mas todo dia vai e volta
e nunca vai e volta
sozinho.
foi o jarro à fonte
que deveria saber já o caminho
mas todo dia vai e volta
e nunca vai e volta
sozinho.
Fases
Poesia
quando tua pele
era macia
tu te afastavas zangada
se dela eu aproximava
minha mão de menino
desajeitada
Poesia
por que não afastas hoje
a minha mão entrevada
da tua pele enrugada?
quando tua pele
era macia
tu te afastavas zangada
se dela eu aproximava
minha mão de menino
desajeitada
Poesia
por que não afastas hoje
a minha mão entrevada
da tua pele enrugada?
Justiça
Se Deus me conserva entre os vivos, não há de ser por acreditar que eu tenha ainda algo de bom a fazer como escritor. Será, mais provavelmente, para punir por seus pecados meus dez, onze ou doze leitores.
"Para os salgueiros junto ao rio", de Yu Xuanji
"Vultos em jade às margens devolutas
à névoa assombram pavilhões distantes
Reflexos deitam-se nos rios do outono
e flores descem sobre os pescadores
Peixes ocultam-se às raízes densas
enlaçam os ramos barcos visitantes
Respiração da noite, a chuva e o vento
ecoam tristes sonhos revolutos."
(De Poesia completa de Yu Xuanji, tradução de Ricardo Primo Portugal e Tan Xiao, publicação da Editora Unesp.)
à névoa assombram pavilhões distantes
Reflexos deitam-se nos rios do outono
e flores descem sobre os pescadores
Peixes ocultam-se às raízes densas
enlaçam os ramos barcos visitantes
Respiração da noite, a chuva e o vento
ecoam tristes sonhos revolutos."
(De Poesia completa de Yu Xuanji, tradução de Ricardo Primo Portugal e Tan Xiao, publicação da Editora Unesp.)
sexta-feira, 5 de agosto de 2016
Rasura
Gostes ou não,
não és o que pensas ser, és
de ti um arremedo,
uma contrafação
da cabeça aos pés,
não és o que pensas ser, és
de ti um arremedo,
uma contrafação
da cabeça aos pés,
Laudo
Não se preocupe. Se aqui há um néscio,
Certamente não é você.
Um néscio escreveria néscio
Ou só com "s" ou só com "c".
Certamente não é você.
Um néscio escreveria néscio
Ou só com "s" ou só com "c".
Estatística
Escrevo, mas para quem?
Meus livros estão na estante,
Todos passam, vão adiante,
Não os apanha ninguém.
Meus livros estão na estante,
Todos passam, vão adiante,
Não os apanha ninguém.
Soneto do falso Romeu e da ninfômana Julieta
Quando nos couber dizer
O que fizemos da vida,
Como nós, minha querida,
Havemos de proceder?
Diremos toda a verdade
Sobre nossa pequenez,
Nossa falta de altivez
E nossa mediocridade?
Confessarás que enquanto eu,
Este teu falso Romeu,
Me acabava nos puteiros
Tu, Julieta, te vingavas
E pelos portos rondavas
Caçando teus marinheiros?
O que fizemos da vida,
Como nós, minha querida,
Havemos de proceder?
Diremos toda a verdade
Sobre nossa pequenez,
Nossa falta de altivez
E nossa mediocridade?
Confessarás que enquanto eu,
Este teu falso Romeu,
Me acabava nos puteiros
Tu, Julieta, te vingavas
E pelos portos rondavas
Caçando teus marinheiros?
Como sempre
Ajeitando a corda no pescoço, ele abre seu último sorriso na vida: lembra-se de como lhe era difícil, também, dar o nó na gravata.
"Despejo", de Pedro Gonzaga
"joguei fora os livros de russo
despistei o professor de francês
há coisas
tantas coisas
que não aprenderei
devia estar triste
mas avisto o dostoiévski
reconheço o flaubert
e os saúdo cordialmente
como aos bilheteiros
de uma estação estrangeira
a quem votamos uma mesura e um sorriso
sem sabermos bem por quê."
(Do livro Falso começo, Edições Ardotempo.)
despistei o professor de francês
há coisas
tantas coisas
que não aprenderei
devia estar triste
mas avisto o dostoiévski
reconheço o flaubert
e os saúdo cordialmente
como aos bilheteiros
de uma estação estrangeira
a quem votamos uma mesura e um sorriso
sem sabermos bem por quê."
(Do livro Falso começo, Edições Ardotempo.)
quinta-feira, 4 de agosto de 2016
Falha
Se até a trigésima página de um livro ou o trigésimo minuto de um filme não aparece um gato, começo a me perguntar se essa ousadia de dispensar tão importante personagem será mantida até o fim.
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Linhagem
Não entendo
como poderei honrar
minha ascendência assim
descendo descendo
sempre descendo.
como poderei honrar
minha ascendência assim
descendo descendo
sempre descendo.
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Mimo
Merecias que eu mandasse a ti
um presente leve e suave
como o devaneio de uma ave
um suspiro de colibri.
um presente leve e suave
como o devaneio de uma ave
um suspiro de colibri.
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Final do monólogo de Molly Bloom
"... e como ele me beijou contra a muralha mourisca e eu pensei tão bem pedir de novo sim e então ele me pediu quereria eu sim dizer sim minha flor da montanha e primeiro eu pus os meus braços em torno dele sim e eu puxei ele pra baixo de mim para ele poder sentir meu peito todo perfume sim o coração dele batia como louco e sim eu disse sim eu quero Sins."
(De Ulisses, de James Joyce, tradução de Antônio Houaiss, edição da Civilização Brasileira.)
(De Ulisses, de James Joyce, tradução de Antônio Houaiss, edição da Civilização Brasileira.)
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quarta-feira, 3 de agosto de 2016
Soneto do rapazelho de frete
Fui do time dos tolinhos.
Se me falavam de amor,
Eu logo cedia, por
Um abraço e dois beijinhos.
Hoje estou entre os nojentos,
Sou sórdido, torpe, vil,
Se não me vendo por mil,
Dou-me por mil e quinhentos.
Se ontem fui palerma, otário,
Sou agora mercenário,
E há quem pior ainda me chame.
O que me move é o dinheiro.
Se quiser ter-me, primeiro
Me mostre a bolsa, madame.
Se me falavam de amor,
Eu logo cedia, por
Um abraço e dois beijinhos.
Hoje estou entre os nojentos,
Sou sórdido, torpe, vil,
Se não me vendo por mil,
Dou-me por mil e quinhentos.
Se ontem fui palerma, otário,
Sou agora mercenário,
E há quem pior ainda me chame.
O que me move é o dinheiro.
Se quiser ter-me, primeiro
Me mostre a bolsa, madame.
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Jeitinho
Para não lhe exigirem muito,
utiliza um pretexto:
diz que é um escritor bissexto.
utiliza um pretexto:
diz que é um escritor bissexto.
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Único
O instante do amor
deveria ser
um só na vida
como o instante
de morrer.
deveria ser
um só na vida
como o instante
de morrer.
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Trovinha auspiciosa (para Pris)
Um dia nos reencontraremos
num lugar diferente
onde felizmente
não nos reconheceremos.
num lugar diferente
onde felizmente
não nos reconheceremos.
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Antônimos
Na prática
e na matemática
sempre estou num
e ela noutro lado
Se um dia acontecer
de estarmos no mesmo
ela ficará pasma
e eu pasmado.
e na matemática
sempre estou num
e ela noutro lado
Se um dia acontecer
de estarmos no mesmo
ela ficará pasma
e eu pasmado.
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Fadiga dos materiais
Expressões notáveis são tão sordidamente repetidas que caem sob domínio comum. Vazio imenso é uma delas - tão rica na origem e hoje tão andrajosa.
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Inventário
Já me chacoalharam
várias vezes
me sacudiram
me emborcaram
me esparramaram
examinaram tudo
e o vazio que encontraram
sempre foi todo o meu conteúdo.
várias vezes
me sacudiram
me emborcaram
me esparramaram
examinaram tudo
e o vazio que encontraram
sempre foi todo o meu conteúdo.
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História
Tu te plantaste em mim
me bebeste
me sugaste
cresceste
morreste
e deixaste
tuas raízes podres
em mim.
me bebeste
me sugaste
cresceste
morreste
e deixaste
tuas raízes podres
em mim.
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"Amor não correspondido", de Thomas Bernhard
"O professor de geografia Pittioni, atormentado pelos alunos enquanto lecionou no ginásio, não voltou de suas férias. Em Hütschlag, aonde tinha ido de início apenas para estudar os escritos de Humboldt e relaxar, enforcou-se no quarto para o qual se retirara apenas por alguns dias. Em testamento, deixou para os alunos tudo o que possuía. Agora que tomara a única atitude possível, escreveu Pittioni, não queria que pensassem que ele os odiava. Ao contrário. Mas seu amor pelos alunos, por mais que ele houvesse se empenhado, não fora aceito. Qualquer que houvesse sido a razão para tanto, esperava que eles o perdoassem."
(Do livro O imitador de vozes, tradução de Sergio Tellaroli, edição da Companhia das Letras.)
(Do livro O imitador de vozes, tradução de Sergio Tellaroli, edição da Companhia das Letras.)
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terça-feira, 2 de agosto de 2016
Eva (para Ana Farrah Baunilha)
A menina má
me ensinou uma prática
um brinquedinho jubiloso
em que um mais um é gozo
e eu nunca mais quis aprender
outra matemática
nem jogar outro jogo.
me ensinou uma prática
um brinquedinho jubiloso
em que um mais um é gozo
e eu nunca mais quis aprender
outra matemática
nem jogar outro jogo.
De Mariana Ianelli sobre Mario Quintana
"Era como Mario Quintana nomeava a poesia: crônica da Eternidade, loucura lúcida, pedra no abismo, água de beber da concha da mão, pomo da árvore da sabedoria."
(Do livro Para aqueles a quem os dias são um sopro, edição da Ardotempo.)
(Do livro Para aqueles a quem os dias são um sopro, edição da Ardotempo.)
segunda-feira, 1 de agosto de 2016
A questão
Frequentemente me pergunto se todo meu empenho literário não tem sido fruto apenas de uma vaidade que, apesar de todos os sinais contrários, insiste em me atirar contra moinhos que continuam rindo de mim como na primeira e decepcionante vez.
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Estilo
Apesar de gostar,
nunca mais lerá Shakespeare.
Tem medo de se influenciar.
nunca mais lerá Shakespeare.
Tem medo de se influenciar.
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Saldo
Tenho por mim tanto desapreço
que antes de me examinarem
já vou baixando o preço.
que antes de me examinarem
já vou baixando o preço.
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Será
Tu me chamarás
uma vez.
Não insistirás,
dirás já ser tarde,
e irás te afastando
por mais que eu
como quem não morreu
te chamar
com a boca coberta de terra;
espera, espera.
uma vez.
Não insistirás,
dirás já ser tarde,
e irás te afastando
por mais que eu
como quem não morreu
te chamar
com a boca coberta de terra;
espera, espera.
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Primórdios
Dia a dia, em silêncio,
crescia nele a convicção
de que a vida não lhe servia
e a morte era sua vocação.
crescia nele a convicção
de que a vida não lhe servia
e a morte era sua vocação.
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Soneto do nome do vilão
Um dia talvez sejamos
Levados a confessar
Que o que chamamos de amor
Foi só algo que inventamos.
Quanto nos atormentamos,
Quanto viemos a chorar,
Por não sabermos lidar
Com esse ser que talvez criamos.
Se não foi amor, então
Que nome dar ao vilão
Que tão fundo nos feria?
Se não foi amor, devemos
Nós admitir que morremos
Só por uma ninharia?
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Cartada
Quando sente o risco de perder o jogo, a gramática tem sempre um ás na manga, pronto para sacar: geralmente uma crase.
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Antipropaganda
Quantos belos textos foram outrora reunidos sob o horroroso título de crestomatia.
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A relação
Conheço literatura já o suficiente para saber como me enganei ao julgar que pudesse vir a ser para ela algo mais que um leitor.
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Aprendizado
Ter escolhido a literatura, tantas décadas atrás, foi bom. Não tive êxito com ela, mas aprendi como exprimir meu fracasso.
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"Soneto X", de Sânzio de Azevedo
"O sol vai pôr-se. A rosa pende a fronte
num desmaio de pétalas vermelhas;
zumbe, a sonhar, em busca do horizonte,
o debandar das últimas abelhas...
Já muitos ventos vergastaram-na antes
e ela, a rosa, serena, resistia,
ungida pelas pérolas brilhantes
do orvalho azul de cada novo dia.
Agora o vento sopra e foge tudo:
nem insetos nem pássaros em torno.
Só desperta o torpor do dia mudo
o arrastar-se das folhas no chão morno.
Cai um manto de brumas e de esplim.
O sol se pôs. A flor é morta.Fim."
(Do livro Canto efêmero)
num desmaio de pétalas vermelhas;
zumbe, a sonhar, em busca do horizonte,
o debandar das últimas abelhas...
Já muitos ventos vergastaram-na antes
e ela, a rosa, serena, resistia,
ungida pelas pérolas brilhantes
do orvalho azul de cada novo dia.
Agora o vento sopra e foge tudo:
nem insetos nem pássaros em torno.
Só desperta o torpor do dia mudo
o arrastar-se das folhas no chão morno.
Cai um manto de brumas e de esplim.
O sol se pôs. A flor é morta.Fim."
(Do livro Canto efêmero)
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