O sol matinal entrava pela janela basculante, condensando o vapor nos azulejos e dissipando pouco a pouco o cheiro de xampu. Com as calças arriadas até as canelas, prestes a começar meu xixi, eu mirava no penico da Turma da Mônica. Ao lado, enrolada numa toalha diante da pia, minha mãe escovava os dentes.
Eu gostava muito de observar minha mãe escovando os dentes pela manhã: sua mão ia e vinha, rápida e precisa, de cima para baixo, depois fazia movimentos circulares, sem espirrar uma única gota de espuma. Tão diferente de mim, que só sabia escovar na horizontal e salpicava de branco a louça da pia, as torneiras, lambuzava o rosto inteiro. Minha mãe era tão hábil que conseguia até escovar os dentes e andar pela casa ao mesmo tempo - uma de suas façanhas que eu mais admirava. Com a mão livre, era capaz de exercer outras atividades, como tirar as roupas sujas do cesto, pentear o cabelo ou guardar uma toalha no armário. Depois, voltava para a pia e cuspia com elegância; a espuma saía da sua boca unida e silenciosa, como uma bolinha de pingue-pongue."
(Da crônica "Bom menino", do livro Nu, de botas, publicado pela Companhia das Letras.)
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