"A verdade é que nossa vida sexual era, como dizem, satisfatória. É uma questão de expectativa - na verdade, de informação. Tenho para mim que a vida sexual de noventa e nove por cento das pessoas neste mundo consiste de um um vigoroso para a frente e para trás, muito bem descrito pela palavra inglesa bonking - um trompaço estrepitoso - e a maioria das pessoas está contente assim. Entre outras coisas, porque sexo complicado exige privacidade e nem todo mundo tem. E também porque, se você não sabe o que está perdendo, então não sente falta. Nossos manuais conjugais eram sentimentais, ainda que bem melhores que o Amor e casamento de Marie Stopes. Por exemplo, era permitido beijar o corpo do parceiro ou da parceira, desde que isso fosse feito com respeito. Quando se sugeria que tudo era permissível, desde que feito com amor, talvez até se pudesse especular sobre esse 'tudo', mas mesmo a imaginação sexual mais vívida se beneficia com um pouco de informação. Sexo oral? Que é isso? Sadomasoquismo? - Do que será que você está falando? Em nome dos historiadores sociais, devo registrar que o clitóris estava longe de ser a sensação que é no momento em que escrevo este livro. (As coisas com certeza mudarão de novo.) Não que os manuais não chamassem atenção para ele. Quando li em Balzac que 'um homem casou-se cedo demais se não for capaz de dar à mulher duas sensações diferentes em noites consecutivas', fiquei cismada, mas quando eu me masturbava, na adolescência, era sobre a vagina, e clitóris era apenas parte do conjunto todo. Um orgasmo do clitóris, por si só, era um prazer secundário e inferior. Se me dissessem que em poucas décadas os orgasmos do clitóris e da vagina se tornariam inimigos ideológicos, ou que as pessoas diriam que o orgasmo vaginal não existe, eu teria achado que era piada."
(De Debaixo da minha pele, primeiro volume da autobiografia de Doris, traduzido por Beth Vieira e publicado pela Companhia das Letras.)
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