sábado, 17 de abril de 2010
Pequenas alegrias urbanas (38) -- O pardal
Esperando o ônibus, o homem viu um pardal que tentava levantar voo na calçada. Parecia ferido ou talvez estivesse paralisado pelo frio intenso da manhã. Olhando para o passarinho, que piava pedindo socorro, ele notou a aproximação furtiva de um gato. Não teve dúvida de que, se não fizesse alguma coisa, o pardal logo seria abocanhado pelo gato. Bateu os pés com estrépito na calçada, mas a fome do gato parecia maior do que seu medo. O ônibus surgiu, distante, e o homem tomou uma decisão. Abaixou-se e pegou o passarinho. Observou que ele estava machucado. Havia sangue em suas penas. Procurando não apertá-lo demais, ele subiu no ônibus, que estava lotado. Um estudante, percebendo o passarinho na sua mão, ofereceu lugar. Em poucos instantes, havia já umas dez pessoas interessadas na sorte do pardal. O homem desceu no seu ponto e foi andando até a padaria. Talvez uma migalha de pão salvasse o bichinho. Mas, antes de entrar na padaria, notou que ele estava morto. Sentiu uma tristeza grande, uma tristeza boa, uma tristeza infantil. Colocou com cuidado o corpo do pardal na mureta de um prédio banhada pelo sol, como se um pouco de calor pudesse fazer um milagre. Ainda olhou duas vezes para trás. Depois, caminhando para o trabalho, sorriu ao pensar na frustração do gato.
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