"Há empurrões e tumulto,
coletes salva-vidas de menos:
isso é óbvio;
então, por que não passar os últimos momentos
praticando nossa modesta arte
como sempre fizemos,
criando um lago de conforto possivelmente falso
em meio à tragédia?
Há algo a ser dito em favor disso.
Imaginem-nos, então, na orquestra do navio.
Todos permanecemos em nossos lugares, tocando
notas breves e dedilhando e marcando o tempo
com nossos instrumentos cotidianos
enquanto os gritos e as botas correm pesados.
Alguns pularam; seus casacos de pele e seu desespero
puxam-nos para baixo. Mãos crispadas se projetam em meio ao gelo.
O que estamos tocando? É uma valsa?
Há comoção demais
para que os outros possam distinguir com clareza,
ou então estão longe demais -
um alegre foxtrote, um velho hino meloso?
O que quer que seja, somos nós com os violinos
enquanto as luzes se esvaem e o grande navio afunda
e a água se fecha sobre ele."
(Do livro A porta, tradução de Adriana Lisboa, publicado pela Rocco.)
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário