quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Três poemas de Guimarães Rosa

"DEFINIÇÃO

O cigarro de fumaça impalpável e brasa colorida,
que se fuma a si mesmo num cinzeiro,
será um poeta?..."

                                           ***

"DELÍRIO

No parque morno, um perfumista oculto
ordenha heliotrópios...
Deixa aberta a janela...

Minhas mãos sabem de cor o teu corpo,
e a alcova é morna...
Apaguemos a luz...

Não sentes na tua boca
um gosto de papoulas?...

Passa o lenço de seda de tuas mãos
sobre minha fronte,
e não me digas nada:
a febre está, baixinho, ao meu ouvido,
falando de ti..."

                                                  ***

"REVOLTA

Todos foram saindo de mansinho,
tão calados,
que eu nem sei
se fiquei mesmo só.

Não trouxe mensagem
e não me deram senha...

Disseram-me que não iria perder nada,
porque não há mais céu.
E agora, que tenho medo,
e estou cansado,
mandam-me embora...

Mas não quero ir para mais longe,
desterrado,
porque a minha pátria é a memória.
Não, não quero ser desterrado,
que a minha pátria é a memória..."

(Do livro Magma, publicado pela Editora Nova Fronteira.)

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