quarta-feira, 14 de agosto de 2013
Criadores e suas criaturas
Num dos romances de Marcos Rey, Entre sem bater, há um homem que, depois de muito ansiar, conquista a mulher que deseja. O primeiro pedido que faz a ela é uma xícara de café. José Matias, outro personagem, este de Eça de Queirós, torna-se uma sombra da mulher amada, mas nunca se declara. Ela se casa, se descasa, vai se casando e descasando, e ele, nos intervalos, reaparece. Só nos intervalos. Mas continua não se declarando. Há homens assim, audazes só na imaginação e no pensamento. São capazes de consumir anos em torno de uma mulher, como satélites, e receiam pedir-lhe uma coisa simples, uma bobagem qualquer, como a companhia em um almoço. Ardem, exaurem-se, definham, morrem, sem a coragem de fazer a única pergunta que por toda a vida quiseram fazer. Temem a recusa. Criaram uma mulher tão etérea e esplêndida que não lhes ocorre pensar que ela possa ter afeto por eles. São escultores que, não tendo em si a beleza, a concebem tão intensamente no rosto de uma mulher, que jamais ousarão fitá-la, e tão douradamente nos seus cabelos, que nunca se atreverão a tocá-los, e tão majestosamente em seus braços que, se os abraçarem, será como se apalpassem, para avaliá-la, uma peça de porcelana.
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