quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

No jornal (Major Quedinho) - 5 - Nelson Lima Neto

Ao chefe de revisão nos meus primeiros anos de jornal, Nelson Lima Neto, cabia uma tarefa que os amantes do lugar-comum chamariam de espinhosa - não pela qualidade dos revisores, mas pela natureza um tanto destrambelhada deles. A revisão era conhecida como um lugar para amansar loucos. Além de loucos, bebíamos um pouco... Para dar uma ideia, havia na nossa sala uns enormes latões de lixo que, no auge da emoção provocada em todo o país pela Copa do Mundo de 1970, eram chutados de um lado para outro, com um fragor que se pode imaginar. Era comum um de nós ajeitar um dos latões, esperar a formação da "barreira" (às vezes composta por até dez revisores), preparar-se e, enquanto isso, ir narrando, como Geraldo José de Almeida: "Atenção, Brasil! Vai cobrar a infração Rivelino! Ele toma distância, olha para o gol. Corre para a bola, atira e..." Nesse instante, a lata saía voando, enquanto a "barreira" prudentemente se dispersava. Quando a lata batia numa das paredes, com um estrondo de mil trovões, o chefe, que acompanhara tudo fingindo nada ver, ameaçava, rindo: "Quem foi o idiota? Vou pôr todos na rua." Se fosse outro tipo de pessoa, teria motivo para mandar embora pelo menos um de nós diariamente. Ele ficava do meio-dia até pelo menos até as duas da madrugada, dirigindo o manicômio. Depois, ia direto para casa. Mas uma noite conseguimos levá-lo para beber. Mal tomou o primeiro gole de cerveja, mostrava-se já bêbedo. Não estava acostumado. Acho que um copinho de groselha faria nele o mesmo efeito. Ele começou a gargalhar gostosamente, escandalosamente. Do bar nós o arrastamos até o bilhar da rua Formosa. Ele não acertou uma tacada. Acho que não estava enxergando nem a mesa. Era preciso levá-lo para casa. A mulher, que ele dizia ser durona, só podia estar preocupada. Pegamos um táxi, chegamos ao prédio em que ele morava e subimos até o seu andar. Um de nós ficou segurando a porta do elevador. Os outros o conduziram até o apartamento. Tocada a campainha, nós covardemente o deixamos lá e corremos para o elevador. No dia seguinte, ele nos contou que a mulher tinha ficado bravíssima, nem tanto com o cheiro de cerveja, mas com outra coisa. Nos bilhares, os frequentadores colocam um avental na cintura, para evitar marcas de giz na calça. Nosso chefe havia se esquecido de tirá-lo.

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