quarta-feira, 24 de abril de 2013
Apontamentos sobre o paciente Raul Drewnick, feitos por ele mesmo
Estou insano, tenho certeza de que assim já começam a me considerar também os outros, e deveria amarrar-me para não escrever nada. Mas agrada-me esta insanidade, e cada dia me apraz mais exibi-la. Descobri que sempre fui assim, sempre tive vontade de ser assim, e só não fui assim para que os outros não precisassem alterar os registros que têm sobre quem eu sou. Eles têm registros sobre mim desde o tempo em que eu era menino e, se saio um centímetro que seja do rumo previsível, inquietam-se e se aborrecem: quem é ele, afinal, para ir mudando assim? Hoje eu sei que sou alguém que odeia esse que está nos registros. Não quero mais ser esse senhor bem-comportado e confiável. Quero ser abominado, execrado e venho diariamente ao micro proclamar-me louco, para que me abominem, me execrem ou me esqueçam. Demência senil talvez seja o nome disto. Não é o primeiro caso na família, mas eu não gosto do rótulo. Preferiria que achassem isto sem-vergonhice, como achavam quando eu era jovem e bebia desvairadamente. Se isto que me liberta é uma doença, receio que logo me venham com tratamentos e piedades. Não quero tratamentos, nem piedades. Não sou feliz, isso não. Mas sinto-me honesto pela primeira vez na vida.
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