sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Pobre coração

Pobre coração, engaiolado num peito velho onde só prosperam catarros, chiados e tosses. Pobre garganta, áspera lixa que deforma as palavras. O coração, o peito e a garganta foram outros. Outros foram os tempos. Também os ouvidos foram diversos. O riacho da infância não canta mais para eles a limpidez nem a cristalinidade. A memória tenta recuperar o murmúrio daquela água, mas o que ela traz é parecido com o ruído de uma descarga sanitária. Os olhos veem flores ainda, mas elas hoje parecem de plástico. Devo ter sabedoria, ela é o fruto próprio da minha idade. Devo ser sábio para aceitar a vida como ela é (ou não é). Depois da sabedoria da velhice, virá a sabedoria dos mortos. O sinônimo de sabedoria é resignação. Alguém já viu algum morto com uma lista de reivindicações na Paulista?

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